A Fuga

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Mensagempor Seth em 30 Out 2007, 20:26

É um conto sobre um personagem que eu usei numa campanha antiga, em que eu tento exercitar um pouco da técnica de narração. Espero que leiam, e comentem, gostando, ou não, do conto. É isso ai, pessoal...

Prólogo:


Eu gosto de visitar tavernas com amigos porque um movimento muito interessante acontece. De anões a gnomos todo ser que bebe um pouco mais – e é escravo de sua moral – costuma soltar a Besta com um pouco de vinho. E isso me é muito útil...

Por isso sei bem o que você quer me servindo esse copo de inebriante néctar, recheado de especiarias. Não, não negue, eu sei pela maneira como você sinaliza ao taberneiro que sirva porções bem generosas para mim. Pela maneira como você, julgando ser muito esperto, joga fora sua cerveja aguada e barata. Sobretudo, pela ansiedade em seus modos, esperando por algo.

Sim, jovem, o que você quer?

Quer saber da minha história?

E o que deseja acendendo essas brasas de um fogo moribundo?Abrindo a ferida cicatrizada? Será que a sua curiosidade vale pelo sofrimento que eu terei? Só para que você saiba os porquês?

Porque mais de uma vez eu clamei aos Deuses para que me dessem consolo. Eles não responderam, pois, para isso, estavam demasiado distante. Clamei, depois, que me dessem vingança. Depois, clamei que me desse o que perdi. Afinal, nós também éramos vítimas, tínhamos filhos e pais, e podíamos amar. Perdemos, porém, tudo. Ah, que seja, ouça, então.

Eu nasci no advento da Era das Guerras de Fogo, no ano que o País das Estrelas foi envolvido na fratricida guerra do Raio da Chuva e da Onda. Ela era assim chamada devido ao brasão dos reis belicosos. Eles cortejavam a magia de meu povo... E, apesar de séculos de neutralidade, nossos anciões – levados pela ambição de alguns – quiseram expandir sua influência e obter mais terras. Mais poder, em suma, e daí o dito: “Contra as Águas Revoltas, surge o Raio que nasce das Estrelas”.

A minha infância em passei na ventura de uma família nobre, rica e feliz. Meu pai era um dos mais bravos capitães, e uma voz respeitada pelo povo. Meu avô era o Guardião dos Planos, o alter ego do próprio Arquimago, e representante da facção moderada. Minha mãe era a princesa dos elfos do Crepúsculo, filha do rei desse povo nortista, descendente do legendário Turudel. Eu, o filho mais velho, herdeiro e – ouso dizer – um grande mago em potencial.

Meu mestre foi o Guardião dos Selos (outro membro do Conselho da Alta Magia, que governava os rumos de nosso povo), o severo e bondoso Rivengil. De sua sabedoria eu me beneficiei, assim como de sua fantástica capacidade de passar a mais complicada das fórmulas cabalísticas com facilidade. Graças a ele muito cedo tomei o manto de Mago-Acólito, o grau mais baixo entre aqueles que tem o título de Mago, um feito considerável dada a minha juventude – eu mal tinha completado vinte anos.

Em meu orgulho eu não me importava muito com os tempos de guerra, e não percebia que meu avô - com sua moderação a favor da paz – perdia muito espaço no conselho. Que meu pai, a testa de seus soldados – a elite dos espadachins de meu povo, que tinham tomado, sozinhos, mais de uma fortaleza e vencido mais de uma batalha – era chamado de covarde e de colaboracionista, pois não matava os soldados adversários que se rendiam. Que os Elfos das Estrelas olhavam com inveja e suspeita para o casamento e a aliança que minha família tinha com nossos primos do norte.

Sim, eu não via nada disso. Estava cego de vaidade, de soberba, como a maioria de meu povo. Só me importava a família e o poder que eu tinha, que não era muito, mas era meu, e o que eu iria ganhar.

Mas não é só isso. Mesmo quando um povo é cego, se seus líderes têm clareza e lucidez o problema pode ser remediado, e nós tínhamos esses líderes, que não quiseram, porém, intervir. Pois a sua cegueira só se rompeu demasiado tarde.



Capítulo I:

Os Elfos das Estrelas são conhecidos pela habilidade com que lidam com as artes. Sua pintura é valorizada mesmo entre os gnomos, sua escultura era admirada nos reinos humanos mais cosmopolitas, sua caligrafia era admirada pelos maiores gramáticos, sua música fazia com que os menestréis julgassem que nada tinham composto de válido.

Os maiores arquitetos sob o orbe dos céus, segundo alguns, são os anões. Se de fato isso é verdade, os elfos deles são pares, com seu estilo fluído que se funde com a natureza. Seus reinos florestais têm casas e palácios dentro das próprias árvores, ou usando ela como parte da estrutura. Não raro um visitante entraria em um salão aos pés de uma sequóia, subiria escadas, e se descobriria em uma inesperada varanda presa à planta.

Uma dos locais legendários e maravilhosos do mundo era, justamente, a capital do País das Estrelas, a cidade de Vianyayia, em uma colina verde; ali a magia tinha sido estudada pela primeira vez, e ali era o coração dos reinos élficos na terra, gêmea da ilha de Rauranán, recordada, agora, apenas em lendas...

Havia sempre música na hora do poente naquela cidade, quando várias pequenas lamparinas da cor de prata e dos jacintos eram acesas, e se cantava, baixinho, pelo sol que morria. Todos os habitantes gostavam de tomar parte naquele ritual, o que nem sempre era possível, especialmente quando se é um mago com um aprendiz impaciente, como era o caso de Rivengil, em seu palacete.

- Meu jovem, você deve aprender que a perícia de um mago não é o grau de destruição que ele causa com um feitiço, ou o realismo de sua ilusão, ou as muitas utilidades de um objeto mágico. É o uso, meu jovem, o uso que ele faz do que aprendeu que irá determinar o quanto ele é poderoso. Um mago que não atentar aos vários elementos de uma situação em que se encontre pode ter uma carreira bem curta. Eu, quando ainda mal tinha recebido o manto de mago enfrentei uma situação assim: Um dragão vermelho vivendo no frio!

- Mas isso é possível, mestre? – O aprendiz parecia surpreso, o que não era de estranhar. Dragões vermelhos eram raros, e habitavam, quase sempre, a cratera de vulcões ativos.

- Mas naturalmente. Deixe que eu lhe conte a história toda. Eu e um grupo de amigos estávamos viajando por um reino que não mais existe, e que fica muito ano norte de nossa terra, em busca de glória, tesouros... E conhecimento sobre certos segredos. Lá soubemos de um dragão que assolava a terra, congelando as parcas colheitas e destruindo aldeias. Decidimos fazer algo a respeito, e fomos ao covil armados com todos os recursos para enfrentar um verme do frio. Qual não foi nossa surpresa, então, quando descobrimos que quem atacava as aldeias eram gênios do frio, respondendo a um dragão de fogo. Perdemos dois companheiros nessa luta, porque não atentamos para vários fatos curiosos: ninguém tinha, efetivamente, visto o dragão, e que uma das aldeias que ele atacou estava queimada, não congelada... Esse erro custou à vida de dois bravos imprudentes.

- E o que vocês fizeram depois?

- Fugimos, curamos nossas feridas, e, depois, voltamos para nos vingar. Sobretudo, aprendemos uma valiosa lição... Que você deve tentar entender sem um trauma tão grande, espero.

- Certamente, mestre.

- Muito bem. Por hoje terminamos nosso aprendizado, e devo revelar que não estou insatisfeito com seu desempenho, antes o contrário. Mas você deve ser mais cuidadoso, ainda que não lhe falte análise...

- Mas mestre, o senhor mesmo não me ensinou que o mago deve ser rápido no agir contra seus adversários?

- Sim, no agir e no pensar. Mas são coisas distintas meu querido Kalring. E a diferença está aqui – tocou, de leve, a testa do elfo mais jovem – e do que saíra daí. Em outras palavras, a rapidez está não no usar em si, mas no como usar... Mas já falamos demais. Tenho de partir para uma reunião do Conselho da Alta Magia...

- Mas já não houve uma reunião no conselho?

- Com efeito, o Arquimago já nos convocou noite passada, porém há mais a ser discutido.

- O que, mestre?

- Não sei mais do que suponho.

- E o que o senhor supõe?

O elfo mais velho, vestindo por cima da túnica um manto pesado ouro e branco, olhou com severidade para seu discípulo, avaliando o jovem. Kalring tinha herdado da mãe a beleza de sua pele alva com cabelos negros, curtos, e olhos da mesma cor, com um brilho malicioso. Do pai herdara a constituição física musculosa, e o gosto pela vida ao ar livre, de tal maneira que tinha recebido treinamento na espada antes de optar pelos caminhos da magia. Também era poderoso – considerando o seu tempo de treinamento, apenas uma década – e tinha grande sede de poder, ainda que a bondade fosse o norte de seu caráter. Era digno do manto de Mago-Emancipado, do cajado de ferro que acompanhava essa nomeação. Seu maior defeito era a impaciência e a tendência e a curiosidade excessiva, mas o mestre se consolava sabendo que com a idade ele se tornaria mais plácido... E então seu futuro seria brilhante como o de poucos. Mas uma admoestação era necessária, de modo que ele respondeu, de pronto:

- Quando chegar à hora, você há de saber, jovem. Agora, vá para a sala e pratique aquela magia.

- Sim, mestre.

O discípulo se retirou da sala, e o mestre tomou outro caminho, por outra porta, que dava para um corredor amplo, decorado com móveis onde repousavam flores e pequenos objetos mágicos de onde saíam notas musicais. Das janelas ele podia avistar boa parte da cidade, inclusive o palácio, chamado de Cúpula da Estrela, onde o Arquimago e o Conselho governavam os rumos da última grande nação élfica do sul. Era ali que se realizavam as reuniões, e era para lá que o Guardião dos Selos, Rivengil, iria.

Não andando, certamente, ainda que fosse uma delícia passear pela cidade, nem voando... Afinal, como todo Grande Mago ele tinha vastos conhecimentos sobre magias, e uma dessas era a de teletransporte.

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Seth
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Mensagempor Lady Draconnasti em 30 Out 2007, 21:05

Interessante, embora que, pela introdução, eu esperava algo curto. Mas enfim, vaos ver como você conduz a história.
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Mensagempor laharra em 31 Out 2007, 00:03

Gostei da premissa da história, apesar de não suportar quase mais nada que tenham elfos, anões e outras criaturas de RPG. Como exercício de narração ficou ótimo, as descrições fluíram bem, mas senti falta de uma frase de efeito para finalizar o capítulo I, como no prólogo.

Também percebi que nesse ponto um erro acabou passando batido na revisão. "...sua música soava fazia com que os menestréis julgassem que nada tinham composto de válido."

No mais é isso, quero ver o resto. :aham:
Tentando encontrar inspiração para terminar o conto abaixo:
O Som do Silêncio: Parte IV - A decisão
Reger está às vésperas de uma batalha onde decidirá seu futuro. Durante o que podem ser seus últimos momentos com a Espada e com Alyse, ele se pega pensando sobre a validade de suas aspirações. Acompanhe o conto no link a seguir:
http://www.spellrpg.com.br/forum/viewtopic.php?f=24&t=1067
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Mensagempor Seth em 02 Nov 2007, 18:37

Pessoal, obrigado pelos comentários. Posto agora o segundo capítulo, em que continuo o exercício mas tento colocar de outra forma as descrições... Enfim, é diferente dos anteriores. Espero que gostem.


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Capítulo II:

Kalring estava parado no centro do salão, de pernas cruzadas, tendo um pesado livro levitando na altura de seu rosto. Era um tomo relativamente novo, encapado com couro negro, onde linhas pequenas, num tom prateado, formavam o desenho de uma ave. As páginas eram de pergaminho branquíssimo, e estavam preenchidas de desenhos caprichados representando gestos, objetos como espadas, pessoas, efeitos das magias, plantas, mapas, brasões, e de linhas de uma caligrafia ampla, elegante e fluída, usando runas de ua variedade arcaica de Élfico.

Aquele era o grimorium do jovem, o livro em que ele anotava tudo quanto fosse pertinente ao seu progresso mágico. Todo o mago tinha um desses, e protegiam essas obras com todas as magias que pudessem, como selos proibitivos e maldições. Ao mesmo tempo pagavam montanhas de ouro para ter o grimorium de outro mago, decifrando de que forma outra mente privilegiada havia trabalhado, e o que havia descoberto e criado. Mesmo assim, poucos tinham a ligação que Kalring tinha com o seu livro: nele cada magia era a lembrança de uma vitória e de dezenas de fracassos e tentativas, cada desenho era resultado de vários esboços, cada informação era resultado de meses e meses de estudo na biblioteca da cidade, na de seu avô, na de seu mestre, na sua própria pequena biblioteca... Era um resumo de sua vida, e de seu caráter, não um manual, ou uma ferramenta.

Naquele momento em especial ele tentava compreender a fórmula cabalística de uma mágica poderosa: Em contato com outras magias, ela poderia anular seus efeitos! Mas era bem difícil. Os últimos três meses de trabalho após descobrir essa magia tinham sido dedicados a ela, mas haviam redundado em fracasso. Agora, porém, ele sentia que tinha encontrado a resposta... Um detalhe quase imperceptível em uma dos postulados, que abria um novo universo para interpretar todo a letra fria, e chegar ao Poder... Ele estava imerso em transe e coberto de suor, com o espírito próximo dos Locais Selados, de onde provinha toda a magia... Seu corpo agora formigava, ele percebia a sensação em algum ponto distante de sua mente... Mas oh, ele sentia o êxtase o espírito vibrando, a boca se abrindo para pronunciar as palavras, a mente em chamas... As mãos faziam os gestos com velocidade e fluidez, como se aquele fosse o mais antigo de suas mágicas, não uma nova...

Algum canto mais lúcido de sua mente pensou que era interessante que sempre que chegava ao clímax, ele sentia um odor peculiar, algo como especiarias, pungente e suave. Era o sinal, achava, de que ele tinha realizado todas as fases com sucesso, faltando apenas o Fecho, os gestos – que ele fazia – e a palavra, vibrando em sua língua.

E Kalring abriu os olhos e conjurou uma magia no instante em que uma flecha de um tom verde ácido foi conjurada por um homem encapuzado. Uma bruma de prata deteve a seta, que desapareceu no ar, para estupor do atacante e felicidade da vítima. Kalring levantou-se rapidamente, sacando uma adaga de dentro das magas de seu manto. O livro fechou-se e desapareceu, enquanto o jovem dizia:

- Quem é você? Como ousa entrar na casa de meu mestre, o Guardião dos Selos, Grande Mago e membro do próprio conselho da Alta Magia? O outro não respondeu, atacando com outra magia, um raio vermelho e ardente. Kalring desviou-se, sabendo que algo de muito, mas muito errado deveria estar acontecendo.

Mas não havia tempo para raciocinar melhor: Sua vida estava em risco. Assim, correu para um dos cantos da sala, onde havia uma coluna de madeira mais grossa, que foi seu escudo contra uma espécie de dardo de eletricidade. Ele, por sua vez, começou a conjurar uma magia poderosa, vendo, em sua mente, um raio de chamas que atingia em cheio ao adversário. Logo em seguida, abruptamente, saiu de trás da coluna e conjurou a magia. Teve de se contentar com um dano menor – era óbvio que o inimigo contava com algum tipo de escudo mágico – mas estava mais confiante. O adversário não tinha mais o fator de surpresa, e bem – ele lutaria com tudo o que tivesse. Ainda que morresse, o inimigo iria se arrepender de ter cruzado o caminho de Kalring.
Editado pela última vez por Seth em 03 Nov 2007, 09:51, em um total de 2 vezes.
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Mensagempor Lady Draconnasti em 02 Nov 2007, 22:36

Kalring? Você mesmo no conto? XD

Um pouco mais agil. Particularmente, adorei a descrição do grimório.
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Mensagempor Seth em 06 Nov 2007, 14:34

Kalring? Você mesmo no conto?

Um pouco mais agil. Particularmente, adorei a descrição do grimório.


Sim, é a história desse personagem, ou melhor: Váios backgorunds de personagens estruturados num conto.

Legal, o grimório foi baseado em um caderno meu que eu usava nas sessões de Rpg... :b

Mais um capítulo:

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Capítulo III


Em geral, as reuniões do conselho eram convocadas pelo Arquimago, e reuniam todos os Guardiões, e mais quem fosse necessário. Muito raramente o a Assembléia dos Magos era convocada, quando estariam presentes todos aqueles que tivessem o título de Mago. O Conselho ocupava um dos salões mais importantes do palácio, exatamente embaixo da cúpula das estrelas, na torre central. O Arquimago estava sentado em um trono de pedra repleto de arabescos e enfeites elaborados, como um dossel de cetim por cima. Parecia um tanto quanto confuso, e aquilo era perturbador.

Ao lado do trono do Arquimago, mais abaixo no estrado, ficava o sólio do Guardião dos Planos, o alter ego do Arquimago, seu colaborador mais próximo e o responsável pela defesa do Reino das Estrelas em outros planos de existência. Naquele dia, porém, o trono de pedra estava vazio, e era a primeira vez em quase um século de conselho que o avô de Kalring faltava, e isso causava uma sensação de mal estar. Abaixo do estrado, no piso do salão, estavam outros tronos de pedra mais simples, onde os outros membros do conselho se sentavam. Eram eles o Guardião dos Selos, que garantia a defesa mágica do reino; o Guardião das Chaves, que tratava da defesa mundana; o Guardião das Portas, que tinha como ocupação as relações com outros reinos; o Guardião das Espadas, chefe do exército; o Guardião das Florestas era quem respondia pela conservação daquelas matas.

Além dos guardiões havia os Grandes Magos de cada uma dos caminhos de magia: Transmutação, Conjuração, Evocação, Ilusão, Adivinhação, Necromancia e Abjuração. Juntos eram a epítome da magia em cada um de seus campos, e junto a eles havia mais dois que não optavam por nenhuma dos caminhos em especial.

Juntos eram os governantes do reino dos elfos. O problema era que, naquele dia, os conselheiros ouviam a mais de uma hora uma ladainha sobre a necessidade de apoiar o esforço de guerra, o que não era nenhuma novidade, e um de seus membros estava ausente. Pela expressão do Arquimago ele também não tinha a menor idéia do que estava acontecendo. E era exatamente isso que havia de entranho naquela reunião.

Logo o orador foi intimado a sair, e a reunião se desfez em meio a um clima muito desagradável. O suposto “informante” do Guardião das Chaves não tinha trazido absolutamente nenhuma notícia, e aquela reunião fora apenas para gastar o tempo dos Conselheiros. Mas porque? Que estava acontecendo?

Meditando nessa questão o elfo dirigia-se para sua torre, onde poderia pensar com mais calma e contatar seus informantes e aliados dentro do conselho. Além disso, saberia se seu amigo teria deixado alguma mensagem... Para chegar até aquele refúgio ele tinha de passar por um amplo corredor de mármore branco, austero e sem enfeites. Em geral aqueles espaços estavam desertos, mas Rivengil via, perfeitamente, uma sombra parada ao lado de uma coluna. Imaginando quem seria, ele andou um pouco mais rápido, só para ver o rosto marcado por cinismo de Morgathur, Guardião das Chaves. Rivengil fez um breve movimento, mas foi detido quando o outro disse:

- Tenho uma notícia para você, Rivengil.

- Pois fale.

- Seu amigo, o capitão-mor Turcal está morto. Acabamos de receber a notícia...

- Não, seu maldito! Você acaba de receber a notícia de que seus assassinos foram bem sucedidos! – gritou, descendo as escadarias a frente dos dois o pai de Turcal, Kaltel. Parecia transtornado, com um pesado bordão de prata numa mão e uma espada na outra.

Espere... O Guardião dos Planos tinha faltado, o que era inédito... Mas alguns dos outros guardiões não estavam, nada surpresos... Pareciam aliviados... E fora um dos aliviados que tinha conduzido aquela comédia.

Sim, alguma coisa estava terrivelmente errada. E Rivengil soube que estava correto quando outro Guardião rival, Nantormo da Ilusão apareceu, ladeado por diversos aprendizes. Do outro lado do cômodo a porta havia se fechado, e, de qualquer jeito, o único local onde ele poderia chegar era um salão em que estaria, sem sombra de dúvida, estaria o Grande Mago da Evocação e seus subordinados.

Na verdade, uma armadilha inteligente. Um local em que Rivengil sempre se sentira seguro, e que acreditava realmente sacrossanto. Agora, estava cercado, assim como o avô de Kalring...

Tentando ganhar tempo ele disse:

- O que está acontecendo aqui?

- Os humanos são entusiastas desse curso de ação... Chama-se golpe de Estado.

- Não insulte minha inteligência, seu tolo. Eu e ele somos apenas dois guardiões, o que me diz do arquimago?

- Tem problemas suficientes.

- Nem que vocês quatro se juntassem...

- Oh, mas não faremos isso. Ele está lutando com algo muito mais terrível... Ele está – ou pensa que está – sustentando o mundo contra um dos demônios coroados que nos invocamos. Mesmo nosso poderoso soberano, cujo nascimento remonta a mais de mil e duzentos anos deveria tremer diante de Goth, o corruptor...

- Você não ousaria...

- Eles já ousaram muito mais – gritou Kaltel, cercado por dois magos, fazendo um gesto amplo com as mãos. Naquele momento Rivengil pôde entender que estava diante de um dos maiores magos de todos os tempos, porque a força daquela onda descompactadora nocauteou três dos acompanhantes de Nantormo, deixando-o ladeado por seis partidários, e vendo, surpreso, que o efeito de sua magia era nulo. Rivengil aproveitou para invocar sobre si um poderoso campo de energia na forma de pequenos orbes, onde poderia respirar um instante e utilizar o vínculo que tinha com a mente de seu aliado:

“Saia daqui, Rivengil”!

“Jamais! Podemos derrotá-los”!

“Use a cabeça, meu caro e jovem mago! Eu fui atingido por uma serpente negra, e irei ser paralisado a qualquer momento! Você deve agir para tentar impedir que os desígnios dele se realizem! E salve quem você puder salvar dos meus!”

“Mas os seus não correm perigo...”

“Sim, correm, no momento que ele conseguir provar que eu o ataquei sem o menor motivo, mas se você escapar... Vamos, Rivengil, aja!”

O elfo suspirou, e começou a murmurar o encanto que lhe permitiria passar pela sombra de seus inimigos até a saída. Nos poucos segundos em que a palavra vibrou na sua língua ele pensou para onde deveria ir.

Quais as outras vítimas? Kaltel dissera “salvar os meus”... O que sugeria que os filhos de Turcal estavam correndo riscos, assim como sua esposa...

Tão veloz como podia na forma de sombra Rivengil foi para o palacete do pai de Kalring, pressentindo o pior. A escolha era dura, porque deixava indefeso seu discípulo, mas, ao menos, ele era um jovem inventivo, enquanto a talentosa mãe dele estava cercada por seus filhos mais novos – um deles quase um recém nascido, com menos de um ano de vida.

Mas a sua mente estava na cena que vira poucos segundos antes: Seu mentor e amigo utilizando uma corrente dentada de relâmpagos de tal forma poderosa que subjugara vários dos Altos Magos e, Mestres e Magos Peritos, e um dos Grandes Magos.
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