O Outro do Amor

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O Outro do Amor

Mensagempor Sampaio em 16 Out 2007, 23:10

E cá está meu segundo do conto de uma série, até então denominada "Ensaios Sobre a Loucura". Mais detalhes e o primeiro conto em: viewtopic.php?f=24&t=574
Ainda não fiz uma revisão digna, já que o escrevi ontem, então aceito com prazer apontamentos de erros.
Eis:


___________________________________________



O Outro do Amor



Recebi hoje e novamente, meu salário hipotecado. Um argentino que aluga o antigo apartamento de meus pais me envia todo mês quatro mil reais. O nome dele é Martín, e o odeio pelo nome. Não poderia ser pior receber quatro mil reais de um argentino chamado Martín.

Com seu dinheiro eu compro as coisas que me são úteis, como cebola, tomate, cheddar e ácido lisérgico. Afinal, a vida seria ainda mais sem-graça se fosse só receber dinheiro, gastar dinheiro, blábláblá, Martins e Fonsecas, ônibus e televisão. Eu pelo menos obtenho vários prazeres. Na escrita, na culinária e no meu analista. A minha prostituta. Gosto de chamá-lo de “minha prostituta”, mas só pra mim. Chego, sento, falo e faço ele ouvir tudo que tenho a dizer. Tudinho. Reclamo, esbravejo, falo os pensamentos mais obscenos que tenho ou não tenho, de meus planos, raivas e experiências espectrais. Por vezes percebo um olhar de escárnio. Ele é um homem comum, um homem do povo, da moral do povo, o homem que me vê como um alienígena, um homem com piedade de mim, que aperta seu rabinho bem forte pra pensar que não pode me desprezar, afinal é tudo doença, é tudo sintoma. Sinto-mal. E eu o obrigo a ficar sentado ouvindo porque toda primeira semana do mês trago seu dinheiro, a vista, e pago minha prostituta. Eu te pago pra ficar calado!

Fui descontar hoje o dinheiro de Martín e eis que o corretor me liga falando que o argentino quer me ver. Algo sobre o prédio. Fui até lá e ele mesmo me abriu a porta. Huum... Cabelos castanhos encaracolados quase até o ombro...mais argentino impossível. Nariz grande, brilhante e boca seca. Portunhol. Sei lá porquê, mas tive uma enorme vontade de pular e morder seu pescoço, puxar sua veia com os dentes, mastigar seus ossos e músculos. Tive vontade de devorar seu nariz. Era meu dinheiro em questão, não fiz.

O filho-da-puta quer mudar. Ou finge que quer e quer que eu diminua o aluguel. Posso fazer por três e oitocentos, ele não quis, três e quinhentos e ele não quis, três e duzentos! Nada. Martín... Se ele soubesse como esse nome me dá nojo. Torço e até fantasio todos os dias que ele seja apedrejado na rua até virar uma massa disforme, para depois recolherem os restos e darem às crianças famintas.

Volto andando, com todo dinheiro do mês na carteira. Muitas vezes torço pra que venham me assaltar. Tem tempos que não caio na porrada, gostaria de levar uns murros. Pagaria eles pra levar. Iria propor mil reais a três deles para me deixarem fazer parte da gangue. Tenho 43 anos mas sou forte ainda oras, sou esperto e tenho ácido pra todo mundo!
Andando mais um pouco passo por uma loja de móveis. Vejo uma cadeira tão marrom, tão lustrada e tão deliciosa que não resisto e entro. Uma delícia de cadeira. Cheiro ela e é exatamente o cheiro que esperava, de madeira viva com lustra-móveis. Começo a lambê-la na base e a vendedora se aproxima perguntando se pode me ajudar. Adoro abusar das vendedoras, que também têm de me ouvir e ficarem caladas, concordarem ou serem demitidas. São outro tipo de prostitutas, que nos servem porque precisam do dinheiro. Mas hoje não estou nesse espírito. Ignoro-a e vou direto ao caixa, pergunto quanto está a cadeira, pago a vista, peço pra tirar a comissão da vendedora e vou embora levando a cadeira na mão.

No dia seguinte à tarde fui até meu analista e levei a cadeira. Ele estranhou, mas não expressou muito e perguntou
- E o que vem a ser essa cadeira?
- Comprei essa cadeira ontem, e ela é tudo na minha vida.
- Como assim ela é tudo na sua vida?
Pobre coitado. Ele se esforça, mas tem a cabeça dos que tiveram uma vida superficial mesmo. Não compreende nada, mas me serve exemplarmente. De agora em diante vou ter pouco dinheiro, ou nenhum dinheiro. Terei dinheiro pra pagar minha prostituta?
- Então, vou ficar sem dinheiro, como vamos ficar?
- Como assim?
- Preciso que você fique aí sentado e eu aqui sentado, de graça.
- O que aconteceu que perdeu seu dinheiro?
- Não importa. Preciso que seja de graça. Por que você quer.
- Olha, infelizmente de graça não dá, mas podemos tentar renegociar um preço um pouco abaixo se sua situação estiver realmente ruim.
- Minha situação está péssima!
Eu já suspeitava. É uma puta mesmo.
Tiro minha faca do bolso.
- O quê é isso? Calma, sente-se um pouco. Você não acha melhor se sentar?
Enfio a faca ligeiro no seu tórax. Melhor que uma penetração. Ele grita. Será que ele esperava algum socorro nessa saleta de bordel abandonado? Enfio outra e esmigalho seus dedos que tentam ir contra minha face. Ele tenta falar outra coisa e dou mais um corte na barriga, verticalmente.
- Aaaah! Por favor...
Paro a faca quieta dentro dele. Olho bem nos olhos, segurando para não lhe morder e lhe digo tudo:
- Eu te amo, mas como, inexplicavelmente, amo em ti algo mais do que tu, eu te mutilo.
Enfio a mão no corte que fiz em sua barriga e aperto os dedos tentando arrancar algo lá de dentro. Ele grita e treme muito, puxo a mão mas só vem sangue e pedaços de carne. Vendo os músculos de seu pescoço se esticarem ao gritar veio-me o desejo de morde-lo e mordi. Com muita força mordi e me lambuzei. Engoli nacos seus e neste momento ele parou de se contorcer. Em poucos segundos perdi o gosto por devorá-lo.

Arrastei-o com calma até a minha cadeira e deixei ele lá sentado. Arranquei seus dedos, seu nariz e coloquei seus óculos que haviam caído de sua face durante o confronto. Os óculos pendiam pela ausência do nariz, mas não ficou uma figura menos bela. Contemplei. Queria levá-lo para casa mas sabia dos problemas. Não sei como também perdi tão rapidamente a vontade de devorá-lo. Agora já me parecia uma idéia repugnante!

Deixei minha cadeira, peguei minha carteira e fui morar na rua.
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Mensagempor Lady Draconnasti em 16 Out 2007, 23:46

Meio Jack, o Estripador, mas enfim. Não tenho críticas. O conto foi sádico o suficiente pra cair no meu gosto ;)
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Mensagempor Ermel em 17 Out 2007, 18:01

Ah, tenho de concordar com a Lady, sádico o suficiente para cair no meu gosto. Porem, não sei como descrever ao certo o sentimento indiferente que meu preencheu ao le-lo ou construir uma critica mais plausivel. É como assistir Polanski ou Bergman, você não sabe realmente o por quê de tudo, pode ser algo pessoal ou uma interpretação do cineasta quanto a certos temas.
Enquanto lia tive certas lembrançar de "Repulsa ao Sexo", ja viu? Principalmente o do assassinato, de uma forma, louca, sutil.

A parte em que ele se 'apaixona' pela cadeira é o maximo. A forma rapida, diferente e sutil com que ele se apaixona pela cadeira a primeira vista, e logo apos 'conhecer-la' melhor, para mim, é o apice da historia tanto quanto sua insanidade quanto diversão.

Meus parabens!
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Mensagempor Sampaio em 25 Out 2007, 09:35

Meio Jack, o Estripador, mas enfim


Nada, na verdade bem distante. Muito mais caótico, menos metódico, impulsivo e completamente psicótico.

O conto foi sádico o suficiente pra cair no meu gosto ;)


Não era a intenção ser sádico, nem de perto. O assassinato é um item qualquer do conto, que descreve um fluxo de pensamentos mediante acontecimentos, em uma mente caótica, passional e clinicamente pertubada.

Tem muitas sutilezas no conto, e na verdade o assassinato ocorre principalmente devido a uma intervenção mal-feita do analista.

É um conto bitolado de conteúdo psicanalítico e filosófico, inclusive o título é insiprado em um capítulo do Seminário 11 de Lacan, e "Outro do Amor" é o termo que inclusive Lacan usa para descrever o Grande Outro simbólico para onde o paciente deposita seu investimentyo libidinal-transferencial.

As falas são comuns na clínica e a sequência de eventos pretende retratar de forma realista esse fluxo na psicose. Fluxo de identificações, paixões até partir para o ato.

Escrevi e postei aqui por acreditar que não é necessário um grande conhecimento de psicanálise para compreende-lo, mas que basta um bom nível de empatia, observação do homem e de loucura em sí, claro.

É como assistir Polanski ou Bergman, você não sabe realmente o por quê de tudo, pode ser algo pessoal ou uma interpretação do cineasta quanto a certos temas.


Fico lisonjeado pela comparação. Como disse, é sim repelto de conteúdos, mas a meu ver, ainda sim compreensível para qualquer pessoa que já tenha pensando sobre a mente humana e sobre a loucura.

Enquanto lia tive certas lembrançar de "Repulsa ao Sexo", ja viu? Principalmente o do assassinato, de uma forma, louca, sutil.


Não vi, mas o título já me diz muita coisa.

O que vem a ser?

A parte em que ele se 'apaixona' pela cadeira é o maximo. A forma rapida, diferente e sutil com que ele se apaixona pela cadeira a primeira vista, e logo apos 'conhecer-la' melhor, para mim, é o apice da historia tanto quanto sua insanidade quanto diversão.


Muito obrigado! Fico realmente feliz com os elogios!

Lewmbrando que isso nem é tão distante da realidade já que é comum essa paixão aguda, gozadora, obssessiva, ao mesmo tempo sútil e descartável, em pessoas que estão operando caóticamente. Independentemente da estrutura clínica.

No mais, obrigado a ambos pelos elogios!
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Mensagempor Lady Draconnasti em 25 Out 2007, 15:05

Lewmbrando que isso nem é tão distante da realidade já que é comum essa paixão aguda, gozadora, obssessiva...


Não duvido mesmo.

E quando me referi ao "meio Jack", eu tava falando da cena final, quando ele começa a arrancar pedaços do psicólogo.

Quando sai o próximo?
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Mensagempor Elara em 25 Out 2007, 17:45

Hmmm...

O texto me lembrou ora os textos do meu noivo (porém sem os erros de português), ora uma música de Rogério Skylab.

Em certos momentos tive vontade de vomitar. :blink:

Quanto a erros, só encontrei um de pontuação. Veja:

Na escrita, na culinária e no meu analista. A minha prostituta. Gosto de chamá-lo de “minha prostituta”, mas só pra mim.


Na minha modesta opinião, considero que o uso de dois pontos seria mais pertinente na referência ao analista. Assim:

"Na escrita, na culinária e no meu analista: a minha prostituta. Gosto de chamá-lo de “minha prostituta”, mas só pra mim."

Do outro modo pode ser considerado como marca estilística, mas eu particularmente considero mais entendível com os dois pontos.

Bom, no mais, é um texto interessante. Parabéns!

Chero!
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Mensagempor Lorde Seth em 25 Out 2007, 18:33

HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!

:bwaha: :bwaha: :bwaha:

Sampaio, esse foi bom mesmo, melhor que o outro!

Mais psicótico e compulsivo, impossível. Gostei da idéia que você teve de ligar a vontade dele de morder o pescoço do argentino e depois fazer tudo aquilo com o analista.

E o fato dele tratar a todos que dependessem de dinheiro (ou melhor, tem de receber merd* por dinheiro) como prostitutas. Ele lambendo a cadeira foi massa... E saindo com ela na mão... Rachei ainda mais de rir naquele momento.

Sampaio escreveu: sou esperto e tenho ácido pra todo mundo!


Opa! Filósofo... Escrevendo contos sobre insanidade....

Aliás, o analista deveria ter dado um pouco para ele... :aham: Como meu amigo diria ''Porque o senhor não tenta um pouco disso? Se você não se sentir melhor, ao menos se divertirá bastante...'' :rolando:

Aliás, você podia fazer um final alternativo... O cara realmente cheio de ácido para todo mundo.

Abraços!
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Mensagempor Ermel em 25 Out 2007, 19:54

Sampaio!

Provavelmente, uma grande maioria ja parou pra pensar na loucura humana e sua mente tão complicada. Mas é um campo vasto de mais, grande, tão divertido quanto perigoso. E é a mistura de cada ingrediente, mesmo não tendo citados todos, que torna a loucura um tanto intrigante.

Repulsa ao Sexo é um dos grandes filmes de Polanski, com Deneuve (Que esta bela³ e jovem!!). É uma historia interessante sobre loucura, e o desenvolvimento, os acontecimentos são de uma 'beleza' impar!

Quando sairão mais ensaios?

Abraços!
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Mensagempor Gehenna em 26 Out 2007, 16:06

Kkkkkkkkkkkkkkkkkk :rolando:

Muito bom! :bwaha:

A paixão pela cadeira, o ódio pelo argentino chamado Martín, o desprezo pelas prostitutas... Hilário! A narração calma do personagem me fez lembrar de um filme com aquele cara que fez o Batman... Acho que o nome era Psicopata Americano.
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Mensagempor Sampaio em 26 Out 2007, 22:24

Quando sai o próximo?


Tô apertado na facul e sem computador, portanto deve demorar...rs.

Mas se eu conseguir meios, disposição e tempo, daqui umas duas semanas escrevo outro. Este outro vai ter um teor BEM diferente, já que já tenho bem em mente o que escreverei.


Na minha modesta opinião, considero que o uso de dois pontos seria mais pertinente na referência ao analista. Assim:

"Na escrita, na culinária e no meu analista: a minha prostituta. Gosto de chamá-lo de “minha prostituta”, mas só pra mim."

Do outro modo pode ser considerado como marca estilística, mas eu particularmente considero mais entendível com os dois pontos.


Verdade Elara. Embora as frases curtíssimas e pontuação possam ser estílicas soam por vezes simplesmente incômodas, e uma percepção gramatical maior faz com que o desapreço gramatical sobressaia a questão de estilo.
Fez muito sentido, e concordo com vc. Modificarei.
MUITO obrigado!


Mais psicótico e compulsivo, impossível. Gostei da idéia que você teve de ligar a vontade dele de morder o pescoço do argentino e depois fazer tudo aquilo com o analista.


hahaha Pois é! Já coloquei elementos que levariam ao final ao longo de todo o texto.

E o fato dele tratar a todos que dependessem de dinheiro (ou melhor, tem de receber merd* por dinheiro) como prostitutas.


Adorei sua analogia com as fezes! :cool:
Tem toda razão. Especialmente psicanalíticamente falando.

Aliás, você podia fazer um final alternativo... O cara realmente cheio de ácido para todo mundo.


hauhauhaa Ia ser no mínimo anárquico! hehehe


Repulsa ao Sexo é um dos grandes filmes de Polanski, com Deneuve (Que esta bela³ e jovem!!). É uma historia interessante sobre loucura, e o desenvolvimento, os acontecimentos são de uma 'beleza' impar!


Opa! Valeu cara! Alugarei assim que possível e venho aqui comentar!


A narração calma do personagem me fez lembrar de um filme com aquele cara que fez o Batman... Acho que o nome era Psicopata Americano.


hahaha É esse mesmo o nome. Aliás, filme bacana. Cristian Bale interpreta um psicopata completamente narcisista! Recomendado!


No mais, MUITO obrigado a todos pelos elogios!
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Mensagempor Saxplr em 11 Nov 2007, 21:51

Bom, a minha cara :blink: deve ser uma prova de que o conto é muito bom...

Sério, bom mesmo, a descrição do cara realmente me lembrou literatura russa, cujos personagens convivem no meio de uma sociedade que odeiam. Ótimo mesmo.

Aí chega o final e vc "chuta o balde", o cara não mais se contém, e a psicose toma conta, odiei o ótimo modo como você descreve o ataque ao psicólogo. Muito bom mesmo!

E por fim, já chega da minha dose diária de loucura...
Revista de histórias:
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Mensagempor Aleχ em 10 Fev 2008, 14:11

Olá Sampaio,

Adorei seu conto, do início ao fim, assim como todos aqui, pelo que notei.

Adorei, com certeza, todas as cenas hilárias que você descreve. Porque do meu ponto de vista são cenas realmente engraçadas. Desde o sujeito dizer que tem ácido para todos ou lamber a cadeira, até mesmo ele levar a cadeira ao analista no dia seguinte.

Além disso, gostei também da forma como a loucura é introduzida no conto, como se começasse quase imperceptível e terminasse simplesmente ultrapassando todos os limites. No primeiro parágrafo seu personagem diz que odeia um argentino chamado Martín e o fato de sobreviver às custas dele. Isso não tem nada de anormal, eu mesmo não me acho incapaz de odiar algum argentino chamado Martín.

Em seguida é descrita a relação que o personagem tem com seu analista. E me parece que ele vai ao analista uma vez por mês apenas por vontade própria, por achar interessante, por puro prazer, como ele mesmo diz. E não por doença, ou um sintoma. Aliás, me parece que ele fala de doença e sintoma apenas ironicamente, assim como quando diz que o analista o vê como um alienígena. Enfim, também não há muita anormalidade até aqui, no meu ponto de vista.

Depois disso, são descritos vários pensamentos que passam pela cabeça do personagem, como a vontade de pular no pescoço do argetino, comer seu nariz, mastigar seus ossos, fantasiar o filho-da-puta sendo apedrejado, etc. Aí ele já mostra ser um pouco perturbado, mas ainda mantém a razão, mantém a sobriedade, através do trecho "Era meu dinheiro em questão, não fiz.". Esse negócio de não fazer apenas por causa do dinheiro, não sei se fui ingênuo, mas me pareceu também pura ironia.

Logo após vem o parágrafo hilário em que o personagem lambe a cadeira e leva ela pra casa na mão. Isso já deixa claro que muito normal ele não é, mas não dá uma dimensão da loucura. Ele parece apenas ser um pouco maníaco por cadeiras, talvez. Melhor do que ser maníaco por sangue. Mas de qualquer maneira, já prepara o leitor para que algo mais incrível ainda aconteça nos momentos finais. Esse parágrafo já faz o leitor dar aquele passo à trás que todos dão quando estão à frente de um louco. O maior inimigo aqui é a imprevisibilidade que o personagem exalta, e não os atos que ele já cometeu. Lamber uma cadeira novinha não é um crime, mas se ele lambeu a cadeira agora, o que será capaz de fazer amanhã? Qual o limite para a sua insanidade?

E é justo no dia seguinte que ele já nos mostra qual o seu limite, ou melhor, é no dia seguinte que ele nos mostra não ter nenhum limite, porque suas atitudes são simplesmente as piores possíveis. A cena começa ainda hilária, com o personagem chegando na cena do crime carregando sua cadeira. E logo em seguida o sorriso é tirado à força do nosso rosto quando ele tira a faca do bolso. E então o sujeito perde completamente a razão (ou a nossa visão do que é ter razão), perde totalmente sua condição de humano (ou o que nós achamos ser a condição humana) e se transforma num monstro desumano. Faz com seu analista o que mais queria ter feito com seu argentino, mas não fez por dinheiro, e nos mostra que ele é capaz de tudo, e que deve realmente dar valor ao seu dinheiro, porque nós acreditamos sem contestar que ele realmente teria pulado no pescoço do argentino.

E é nos momentos finais do conto que nós conhecemos a natureza do psicótico, e perdemos toda a confiança nele. Gostei mesmo dessa forma como você introduziu a loucura. É interessante analisar como seria se o primeiro ato do conto fosse esse assassinato e o último fosse ele dizendo que odeia o argentino. Certamente leríamos o conto inteiro já com o pé atrás e terminaríamos talvez achando que esse psicótico ainda guardava um pouco de razão consigo. Mas na verdade, ele sempre foi o mesmo. Nós é que não o conhecíamos. Lidar com ele é lidar com um ser humano não domesticado. E é interessante também como ele, além de mostrar sua verdadeira natureza, ainda se contradiz completamente em alguns pontos, como quando assassina um dos prazeres da sua vida, ou quando abandona no bordel simplesmente a cadeira que é tudo na sua vida.

Porém, não é a psicose o que eu mais gostei no seu conto, e sim o psicótico. Adorei seu personagem. Você criou e desenvolveu ele com muita maestria, convencendo muito bem. Acho realmente difícil criar um louco convincente, imprevisível por natureza, e acho que você fez isso muito bem. Adorei mesmo. Parabéns!

Bom, era isso. Desculpe pelo comentário atrasado, mas só conheci agora seu conto. Espero que poste mais.

Abraço!
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Mensagempor Captain Beefheart em 10 Fev 2008, 16:22

Eu já havia lido este aqui mas pelo jeito esqueci de elogiar. Está tão bom quanto o outro, mas pouparei você de outra declaração de amor de minha parte :bwaha:
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Mensagempor JOE_KR em 13 Fev 2008, 20:07

Koé!!!

Conto vago e um pesado. Vago porque o significado dos atos do personagem não é explícito: sabemos de seus desejos imediatos, de alguns que reprime, muitos ligados a expressão oral do que sente ou pela via da agressividade. Mas, qual a origem desses desejos, hã, peculiares? Porque os expressa dessa forma? O que, exatamente, sente nos momentos precedentes, posteriores e enquanto realiza o que quer? Ao longo da narrativa, há algumas pistas deixadas, uma espécie de mosaico de informações. É como um quebra-cabeças onde faltam algumas peças.

Por outro lado, como já dito, é pesado. Não no sentido da violência da cena do psicólogo e nas suas ideias do que fazer com o argentino, mas na "carga" do conto, por assim dizer. A abordagem optada na narrativa é de centrar a sua dinâmica no psicológico do personagem, do qual, como já dito, só há pistas. É isso que o torna um pouco difícil de entender.

No mais, você disse que o título é referência a um artigo de Lacan, certo? Poderia esclarecer sobre o que é o artigo?

Falow e té +!!!
Ass.: JOE K.R [que nunca leu Lacan...]
Minhas Palavras são escolhidas, minhas obras não têm igual; só para o tolo elas são vazias, para o sábio elas conduzem à glória.

- Hammurabi
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Mensagempor maksimun em 14 Fev 2008, 12:31

Sampaio escreveu:Não era a intenção ser sádico, nem de perto. O assassinato é um item qualquer do conto, que descreve um fluxo de pensamentos mediante acontecimentos, em uma mente caótica, passional e clinicamente pertubada.


Mas, você não se inspirou em ninguém real pra escrever certo? Digo, quero dizer... bom, vc não tem problemas... certo? aueaeuhaeuhaeuhaeuhae

Acrescentar algo a mais além do que já foi falado aqui é meramente enxugar gelo. Grande conto!

Abraços!
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