Koé!!!
Criei esse pequeno conto há um ano e meio atrás mais ou menos. Ele marcará a minha estréia na nova spell, ou a minha re-estréia na spell [dependendo do ponto de vista, hahaa =p].
Espero que gostem.
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O homem por trás das câmeras
Cada passo que damos pelo shopping é vigiado – ou, pelo menos, assim deveria ser. Em qualquer canto dele, há uma câmera que trabalha silenciosamente registrando o que se passa. E, do outro lado dela, existe um homem que é pago somente para ficar assistindo ao que é filmado. E este homem é o Seu Domingues.
Seu Domingues é uma pessoa discreta, não por ser calculista, introvertido ou controlado, mas apenas por ser comum demais. Ele tem cerca de cinqüenta anos, uma barriga protuberante e cabelo branco com entradas acentuadas. Gosta de ver futebol e filmes de ação (adora Velocidade Máxima e qualquer outra coisa “cheia de adrenalina”), de beber cerveja e de ler as manchetes e a parte de esportes dos jornais. Enfim, apenas mais uma pessoa como qualquer outra.
Ele trabalha nisto há oito anos. Começou no emprego todo empolgado com a idéia de acompanhar a vida alheia: só desgrudava os olhos dos monitores na hora do almoço ou de ir embora. Mas a excitação inicial foi aos poucos diminuindo, até chegar o dia em que ela acabou. Passou a alternar o olhar entre os monitores e o relógio, tamanho era o tédio – afinal, raramente acontecia algo de interessante – e a vontade de ir embora.
Um dia, levou um jornal para o trabalho. Leu-o com certo receio, pois sabia que o correto seria vigiar os monitores, porque era para isso que lhe pagavam. Na quarta-feira seguinte, levou o caderno de esportes, o leu todo, ainda com o mesmo peso na consciência. Voltou a levar uma leitura para o trabalho na sexta-feira, e desta vez receou menos. À medida que ia ficando com cada vez menos pé-atrás de ler durante o expediente, ia levando com maior freqüência coisas para ler. Isto até o ponto em que perdeu totalmente o receio e a leitura durante o horário de trabalho se tornou hábito. Recentemente, ele não tem levado somente jornais – afinal, se acaba de ler um em pouco tempo – mas também livros. Acabou de ler Código da Vinci, do Dan Brown, na última segunda e agora está lendo O Zahir, do Paulo Coelho. Acha que está se tornando uma pessoa culta e bem-informada.
O que mais gosta no seu trabalho é fato dele ter lhe rendido ótimas histórias para se contar enquanto toma cerveja no bar com os amigos. Uma de suas favoritas é de quando um dos elevadores parou no segundo andar da garagem e um dos seguranças falou com ele pelo walkie-talk:
-Aí, Seu Domingues, pode dar uma olhada aí nos monitores para ver se tem alguém preso no elevador? Ouço barulho lá dentro, mas quando eu chamo ninguém responde!
Quando olhou para o monitor correspondente ao elevador que estava parado, falou logo no walkie-talkie:
-Caramba! Tem um casal trepando lá dentro!
Cinco minutos depois, toda a segurança do shopping estava dentro da sala.
Bem, poderia passar mais tempo falando sobre o Seu Domingues, as suas anedotas do ofício e tudo mais, mas tenho que ir embora agora. Tenho um encontro com a filha dele - no shopping, porque é o único lugar onde ele me deixa levá-la.