por Bahamute em 30 Nov 2008, 12:28
É o fim do mundo.
Mas não, o planeta não vai explodir, não vai cair nenhuma rocha espacial gigantesca, nem o aquecimento global vai matar-nos.
É o fim do mundo como conhecemos, a partir de agora, a nova era começa. A TV ta mostrando, pai que mata filha, filha que mata os pais, famílias em guerras internas e particulares.
Incesto, pecado e traição, cada vez mais comum, cada vez mais parte da sociedade.
Amanhã veremos o casamento entre irmãos de sangue legalizado. O filho do pai vai rachar a cabeça do velho e assumir o controle da empresa. O lugar agora é dele por direito.
Enchentes, terremotos, furacões e chuvas torrenciais estão cada vez mais comum, cada vez fazendo mais parte de nossas vidas.
Eu não ligo. Eu estava cagando quando o terremoto começou, só deu tempo de subir as calças, sair correndo do banheiro e descer as escadas. Meus pais, que estavam na sala vendo TV, foram esmagados pela estante quando essa veio abaixo. Não tive nem tempo de chorar.
Correndo pela rua, eu vi pessoas saindo das casas, vi o céu ficar rubro e vi um cachorro desnorteado pela terra tremendo. Caralho, nunca vai parar?
Ainda correndo, eu sabia, é o fim do mundo, talvez Deus esteja cansado de tanto pecado e tanta maldade. E você acha que eu ligo? Eu corro para salvar minha vida, Deus vai reconstruir tudo, e eu vou estar lá para ver o recomeço.
Tanta tecnologia se perderá, mas eu não ligo. To até me sentindo bem com tudo isso. Vou ser o único, o ultimo ser vivo desse planeta. O terremoto tornou-se mais intenso quando eu virei a esquina, e vi um prédio inteiro vindo abaixo. Se foderam. Quem quer que estivesse ali não iria sobreviver. Antes eles do que eu...
Nunca fui tão vazio, mas estou com uma euforia gostosa dentro de mim, e nunca vi um tremor demorar tanto a passar. No mais, eu queria que tudo acabasse.
Eu queria cuspir na cara do mundo, queria poder ver cada um dos meus inimigos sendo esmagados por grandes pedaços de concreto, enquanto a trepidação perseverasse.
Correndo, vendo as casas vindo abaixo, vendo os postes caindo e os fios de alta tensão chicoteando freneticamente, meu fôlego não acabava. É estranho que eu consiga correr tanto. Ta, eu to bem condicionado. Subir ladeiras para descer com meu skate fez de mim um cara com fôlego. Foda-se, vou correr até não poder mais! Correrei até onde a terra não treme!
Só tive tempo de gritar um palavrão, quando vi um poste caindo em minha direção, a corrente elétrica me fez apagar, e tudo o que lembro é isso!
- Mas, que história! – disse o doutor com o bloco de notas na mão –
- Pois é... E eu ainda não achei meu skate...
- Bom, estamos evoluindo bem! Creio que em breve você poderá se juntar aos demais – Continuou o Doutor –
- Sério meu velho? –
- Eu sempre sou sério... – Disse o doutor, levantando-se da cadeira e saindo da sala totalmente almofadada, acenou para o garoto que estava ali sentado, preso numa camisa de força, com o olhar fixo em um canto do local e cabelos desgrenhados –
- Como ele está? – Perguntou a mãe –
- Ainda relutante, é perigoso soltá-lo agora – Disse o Doutor – Ainda está delirante e contando as mesmas historias –
- Sinto me tão mau...
- Não sinta, você não tem culpa, ele é violento, o acidente o deixou assim, de sanidade questionável...
- Ela tava grávida, doutor! O caminhão esmagou o lado dela, meu filho ficou ileso, ele acha que a culpa é dele!
- Muitos pacientes reagem das mais diversas formas a esse tipo de acidente, mas teu filho, ficou violento. Teremos de manter ele aqui até conseguirmos curá-lo.
Abafadas pelo barulho de uma das alas hospitalares caindo, o grito de pessoas desesperadas, e som de vidro quebrando, o doutor e a mãe se entreolharam, quando um guri pulou pelos escombros, sem camisa, e correndo freneticamente com uma única gota de suor escorrendo pelo corpo.
A mãe pensava no filho, enquanto o terremoto tomava conta do lugar e ia lentamente derrubando o prédio, o filho, sorridente dentro da sala almofadada, preso a camisa de força e balançando se para traz e para frente, repetia constantemente...
- É o fim do mundo... E eu me sinto bem...
And I feel fine...
Editado pela última vez por
Bahamute em 30 Nov 2008, 15:11, em um total de 1 vez.
Aquele abraço!