Scarlet Hood

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Scarlet Hood

Mensagempor Gehenna em 15 Abr 2008, 15:50

Há pouco tempo, entrei em um novo grupo de rpg, onde fiz um personagem não muito convencional, o qual até postei na sessão de D&D. Por gostar muito desse personagem, acabei escrevendo esse conto como "adicional" ao histórico dele.




Scarlet Hood


A estrada pela floresta era fria, devido à proximidade das Montanhas Uivantes, escura, devido ao volume das copas das árvores, e deserta, devido as feras que sempre rondavam pela região. A mulher cavalgava sozinha, ignorando os possíveis perigos que se escondiam nas sombras. Sua pele era queimada de sol, seus olhos eram verdes e seus cabelos eram claros e avermelhados. Usava uma grande capa vermelha de viagem com capuz, que a protegia do sol e da chuva. Por baixo da capa, viam-se roupas de couro, que ofereciam uma leve proteção, sem incomodar durante os longos períodos na estrada.

Seu nome era Scarlet Hood e, desde muito jovem, teve de aprender a se virar sozinha, ao ter sua família morta por monstros que, mais tarde, foram mortos por aventureiros corajosos. Ao perder sua família de forma tão repentina, se sentiu confusa e sozinha no mundo. Decidiu que seria como aqueles aventureiros, viajando por aí para salvar, ajudar e vingar as pessoas que não podiam fazê-lo sozinhas. Como herdeira da pequena fazenda dos pais, conseguiu dinheiro para viajar até um templo da Ordem do Deus Guerreiro, onde se tornou pajem, para depois, após anos de treinos e estudos, se tornar uma verdadeira guerreira.

Com os anos, aprendeu que a vida de aventureira não era tão fácil e, muitas vezes, era necessário aceitar trabalhos não muito honrados, para não morrer de fome. Se tornara uma mercenária, como tantos outros que havia pelo mundo. Enfrentou feras, monstros e vilões, ao lado de diversos jovens como ela, porém, não permaneceu junto a nenhum grupo, mantendo-se sempre afastada de todos.

Tomou uma trilha lateral que acabou chegando num riacho que descia a montanha, então saltou do cavalo para encher seu cantil, antes de continuar o percurso. Um calafrio lhe percorreu a espinha, de repente, numa clara sensação de perigo, fazendo-a se abaixar, enquanto se virava, fazendo a capa vermelha esvoaçar. Três flechas passaram por pouco sobre sua cabeça, enquanto ela sacava e atirava uma adaga na direção do arqueiro, que se escondia atrás de uma árvore, onde fora parar a lâmina jogada de mau jeito.

O homem, alto, forte, de cabelos curtos e barba por fazer, vestindo práticas roupas de couro, como ela, sacava mais flechas de sua aljava, para disparar contra Scarlet, enquanto esta buscava abrigo na vegetação local, desembainhando sua espada, para tentar uma aproximação. Ela apurava a audição, para tentar presumir a movimentação e localização do inesperado inimigo, mas ele parecia conhecer bem o lugar. De repente, saindo de trás de uma árvore ao longe, duas flechas voam em sua direção, tendo uma terminando por se encravar em seu ombro esquerdo.

Mordendo forte, para agüentar a dor, ela quebra a longa haste fixa em seu corpo e se move, correndo por entre as árvores. Aquele homem parecia estar acostumado com o terreno. Caminhava sem fazer barulho e a emboscava bem. Era um caçador. Felizmente, ela aprendera a se cuidar sozinha. Da segunda vez que o atacante atirou contra sua capa vermelha, acertou apenas o tronco da árvore. Scarlet se mostrara escondida em outro lugar, revelando-se com uma arma que detestava usar. Uma explosão pôde ser ouvida à quilômetros dali, quando a pólvora se incendiou, enviando o projétil da “pistola” contra a mão do atacante, destruindo seu arco, arrancando-lhe dedos, gritos e pragas.

A perigosa arma de pólvora e o conhecimento de como usa-la, fora ganho em um rápido relacionamento amoroso, em um dos grupos de aventureiros com quem havia viajado, mas, como sempre, não durara. Ele insistira, porém, que ela ficasse com a arma, como uma lembrança. Scarlet então, teve tempo de se aproximar de seu caçador que já sacara um machado com a mão boa, para enfrentá-la.

Ambos tinham apenas um braço bom, estando igualmente debilitados, porém, o caçador parecia levar vantagem sobre sua presa, que nem ao menos sabia por que estava sendo atacada. Aventureiros não raramente faziam inimigos, em suas jornadas. Um adversário que fosse prejudicado e deixado vivo, muitas vezes buscava vingança, seja direta ou indiretamente. Os antigos companheiros de Scarlet, muito possivelmente, passariam pela mesma situação, caso já não tivesse ocorrido. Mercenários e caçadores de recompensas estavam sempre prontos para aquele tipo de trabalho.

Scarlet, assim como seu adversário, havia conseguido acertar vários golpes, porém, provocando apenas ferimentos superficiais, até que, num golpe rápido, o caçador acertara-lhe o machado em cheio, inutilizando seu braço bom. Ela soltara a espada, devido ao golpe, e recuara assustada, temendo o fim. Seria morta em uma estúpida emboscada, perdida na escuridão de uma floresta? Rezou ao seu Deus da Guerra, para que não tivesse uma morte tão vergonhosa. Ele a atendeu.

A cabeça do caçador coube inteira dentro da boca daquele lobo gigante, que parecera surgir do nada, matando o algoz da jovem guerreira. A criatura era enorme, sendo maior que um cavalo, com farta pelagem cinza-escuro e olhos que brilhavam em brasas do próprio inferno. O corpo caiu inerte, enquanto sangue jorrava com fartura. O lobo fitava a mulher, enquanto engolia a cabeça do caçador. Lágrimas indesejadas escorriam pela face de Scarlet, devido à dor e à proximidade da morte.

“Este homem será minha refeição, mulher. Pode seguir seu caminho”. Ribombou uma voz de trovão, saindo da boca do lobo gigante, surpreendendo Scarlet.

“Vo-você fala!” Ela disse, mas o lobo apenas pegou o cadáver pelo pé e saiu arrastando-o, pela floresta, se distanciando dali.

“Obrigada”.

“Agradeça a ele, por ter sido melhor que você no combate. Eu estava com fome. Se invertesse as posições, você seria meu jantar”. O lobo disse, após soltar a perna do caçador e virar sua cabeçorra na direção da mulher. Sussurrando uma rápida prece, Scarlet manifestou um pequeno milagre concedido por seu deus, diminuindo a gravidade do ferimento em seu braço e chamando a atenção do lobo.

“É uma feiticeira? O que faz viajando por esta estrada?” O lobo perguntou, mostrando um novo interesse pela mulher.

“Feiticeira? Não, não. Sou uma guerreira, devota da Guerra. Em troca de minha fé, meu deus me concede alguns pequenos dons que acabam se mostrando úteis, vez ou outra. Estou levando uma cesta de componentes místicos para uma velha feiticeira que mora nestas montanhas”.

“Então você é o novo sacrifício da velha”.

“Como?”

“Porque você acha que ela vive reclusa? A magia dela não é bem vista pelo seu povo”.

“Não importa, sou apenas a entregadora”.

“Empregadores costumam ter certo preconceito, quanto a contratar mulheres para tarefas possivelmente perigosas. Aposto que este fez questão de que fosse você”.

“...” Scarlet não sabia o que dizer. O lobo estava certo. Ela estava sendo enganada.

“Você não é a primeira jovem enviada para servir de sacrifício para a feiticeira, mulher. Vivi aqui durante anos e já vi isto ocorrer inúmeras vezes”.

“E porque nunca as advertiu? Porque não mata a feiticeira?”

“A magia dela é poderosa. Eu teria problemas e isto é coisa do seu povo. Procuro não me envolver. Já tenho problemas demais com meus próprios caçadores”.

“Acredito que, sozinha, eu também não poderia contra a feiticeira, certo? Mas e se nos juntássemos? Você me ajudaria a matá-la?” O lobo a fitou com as duas jóias incandescentes, que chamava de olhos. Seu olhar era carregado de malícia. Concordou.

Enquanto Scarlet apanhava sua capa, se lavava e tratava de seus ferimentos, o lobo terminou seu jantar e discutiu com ela, a estratégia que adotariam. Depois de prontos, tomaram novamente a estrada e, após um dia inteiro de viagem incessante, finalmente chegaram próximos à cabana da velha feiticeira, cujo nome era desconhecido, sendo que os poucos que sabiam sobre ela chamavam-na apenas de Vovó.

O cavalo se aproximou e permitiu que seu condutor saltasse, com sua capa vermelha, com capuz sobre a cabeça. Após bater à porta, segurando a cesta de componentes místicos, uma voz velha, feminina e esganiçada foi ouvida lá de dentro. “Quem é?”

“Sou eu, Vovó. Scarlet Hood. Trouxe sua encomenda”.

“Olá, minha netinha”. Disse a velhinha, após abrir a porta. Era pequena e de aparência frágil. Sua pele era enrugada, seus cabelos, curtos e lisos, eram brancos como a neve, e ela vestia mantos e robes de cores escuras e belas, como azul e púrpura.

“Vamos, entre em minha casa”. Vovó disse, abrindo mais a porta, revelando que o interior era muito maior do que a pequena cabana aparentava.

“Disse a aranha para a mosca”. Uma voz masculina foi ouvida debaixo do capuz, enquanto o homem saltava na direção da velha, se transmutando. Seu corpo, pêlos e presas crescendo rapidamente, enquanto assumia sua forma original, rasgando as roupas que o Lobo tomara do caçador morto.

Com um movimento rápido e uma palavra sussurrada, porém, a velha atirara sobre a criatura um raio elétrico, jogando-o longe, fazendo-o se chocar contra uma árvore. Fumaça saía de seus pêlos queimados, enquanto ele se colocava de pé, ainda abalado pelo potente choque.

“Eu me perguntava quando você seria burro o suficiente para me atacar novamente, Lobo. Desta vez, não vou te deixar fugir. Sua natureza mágica me renderá bons estudos”. A velha disse, caminhando calmamente na direção da fera caída.

“Estude isto!” Lobo brandou, inflando os pulmões e assoprando sobre ela uma rajada de ventos gélidos, cuja força derrubaria uma cabana e cujo frio mataria uma pessoa. Porém, a velha sentiu apenas uma brisa fresca em seus cabelos, como se houvesse uma barreira invisível protegendo-a da nevasca. Com um novo movimento rápido e uma palavra ininteligível sussurrada, a velha provocara uma explosão de chamas, jogando o Lobo contra a árvore novamente.

“Hehehe, acho até engraçado. Você, a fera mais perigosa de toda esta região, não consegue nem se aproximar de mim. Para que serve, agora, essa boca tão grande?”

Uma nova explosão pôde ser ouvida, enquanto a velha sentia um forte baque nas costas que quase jogou-a no chão. Sentindo o sangue escorrer pelo peito, ela se virou para ver quem a atacara. Scarlet saíra de seu esconderijo entre as árvores, empunhando sua pistola, fumegante após o disparo contra a bruxa, que agora estava fora de sua casa e fora de seu Local de Poder. “Para te devorar, Vovó”.

A velhinha se virou novamente na direção do Lobo, mas a dor e a gravidade de seu ferimento a debilitavam demais. A força de suas proteções mágicas diminuíra e não conseguiu conjurar nenhum novo feitiço, antes de ser estraçalhada pelas poderosas mandíbulas da fera. A perigosa bruxa da floresta fora finalmente vencida.

“Você está bem?” Scarlet perguntou, se aproximando do lobo chamuscado.

“Já estive pior. Tome cuidado ao entrar no covil da bruxa. Só porque está morta, não quer dizer que deixou de ser perigosa”. Disse o Lobo, com o focinho e os pêlos próximos à boca, ainda sujos de sangue, após devorar a velha.

“Vou montar um grupo para explorar o lugar. Não quer vir comigo?”

“Eu não me alio a humanos”.

“Mas você é meio humano. E se aliou a mim”.

“Não por vontade própria. Em ambos os casos”. Lobo disse, se virando e adentrando a floresta escura, desaparecendo da vista de Scarlet, que montou seu cavalo e retomou o caminho de volta. Desta vez, a história havia se invertido. Não foram aventureiros que a ajudaram contra monstros, mas sim, um monstro que a ajudara contra aventureiros. Viajou decidida a escolher bem seu grupo e, quem sabe, se manter com eles. Não queria se tornar solitária como a velha Vovó.

Durante todo o percurso de volta, em nenhum momento Scarlet percebeu, mas estava sendo vigiada pelas sombras da floresta. Fora a primeira vez que Lobo se aliara a uma humana e não fora de todo ruim. Talvez um dia, passasse a vê-los como algo mais do que adversários perigosos e comida apetitosa. Após escoltar secretamente a jovem guerreira, voltou para sua floresta.




Como devem ter percebido, é uma versão própria da clássica história da Chapéuzinho Vermelho (Little Red Riding Hood) e o Lobo Mau (Big Bad Wolf). É meio clichê, mas espero que tenham gostado.
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Mensagempor Lady Draconnasti em 15 Abr 2008, 16:47

A volta do Don Lobone, mas dessa vez numa versão séria XD
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Mensagempor Elara em 16 Abr 2008, 17:02

Nhaaaaa...

Tinha escrito outra resposta, mas deu pau aqui e a perdi. ¬¬

De todo modo, como tinha dito, ficou bom, mas acho que as coisas aconteceram rápido demais.

Chero!
This is NOT Sparta!
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Mensagempor Ermel em 16 Abr 2008, 20:05

Gostei da personagem com pistola, achei interessante, mas tenho de concordar com a Elara, foi um pouco apressado.

Enfim, um 'adaptação' interessante. Quem sabe uma Branca de Neve? :b
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Was I more alive then than I am now?
I happily have to disagree
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Mensagempor Gehenna em 21 Abr 2008, 00:03

acho que as coisas aconteceram rápido demais.

tenho de concordar com a Elara, foi um pouco apressado.

Poxa, gente. Isso não é incentivo pra eu escrever contos curtos. :bwaha:

Gostei da personagem com pistola

Scarlet "não tão Little, mas ainda Red Riding" Hood.
Eu adorei esse "nome pronto" dela.
Nem foi preciso pensar. XD

Quem sabe uma Branca de Neve? :b

Primeiramente, to pensando nos Três Porquinhos. Mas quem sabe?
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