Durante as últimas duas semanas escrevi um conto e hoje terminei. Já foi revisado e já está pronto para ser mostrado a todos vocês. Ele ficou um pouco grande e por isso dividi em 4 partes, sendo que hoje estou postando a primeira.
O conto se passa no Japão e eu coloquei alguns elementos culturais japoneses no conto, para dar um pouco de arte para a história. Depois de colocar as 4 partes eu explico alguns desses elementos que coloquei, para os que possam não entender. De qualquer maneira, não prejudicarão a leitura. E peço desculpas também por quaisquer inconsistências que possam existir no texto. O conto tem uma pequena introdução, citando Stephen King, mas nada que seja muito importante na história. Só porque achei legal mesmo. Enfim, espero que gostem, porque foi feito com muito, muito carinho. Leiam e comentem.
Flw!
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Koji e a Flor de Cerejeira
Alex de M. Machado
“Mas ka é a roda à qual todos nós estamos amarrados e quando a roda gira temos de forçosamente girar com ela, primeiro com as cabeças erguidas para o céu, depois girando de novo para o inferno, onde os miolos dentro das cabeças parecem ferver.”
A Torre Negra VII – A Torre Negra
Stephen King
Parte Um
Boa noite, durma bem e cuide-se
Boa noite, durma bem e cuide-se
O tempo nublado e álgido de uma época que estava mais para fim de inverno que para início da primavera combinava impecavelmente com os acontecimentos que iriam se suceder nos próximos nove meses. Uma tempestade de pensamentos rondava sua cabeça e o levava para longe do frio, do vento, da noite que se aproximava. O mundo a sua volta estava agora em segundo plano. Não percebia nem a forte ventania jogar seus cabelos negros por cima do rosto, tapando toda sua visão.
Ele estava já há quinze minutos ali parado, há poucos metros da cabana que ele havia ajudado a construir no verão passado. Não sabia quando nem se algum dia veria novamente essa cabana e quem estava dentro dela. E tudo por causa da maldita guerra. Por que ele precisava ir? Por que a guerra havia de existir? Se não fosse pela guerra, tudo seria melhor. A vida seria perfeita. A paz seria eterna, pelo menos para ele.
Foi obrigado a rir. Conhecia muito bem a si mesmo para perceber sua mania de sempre colocar a culpa nos outros. Ele não sabia muito bem que se realmente quisesse poderia fugir com sua amada e viver feliz para sempre? Mas, então, por que não o fazia? Nem ele mesmo sabia. Ou talvez soubesse e escondesse de si mesmo.
Deu mais alguns passos e chegou à frente da singela porta da cabana. Do que adiantava ficar pensando em todas essas coisas agora? Estava com saudades dela. Oh, e como! Ela ouviu seus passos e veio abrir a porta. Estava linda, como sempre. Ele a abraçou com tanta paixão que pensou se não estaria asfixiando-a. Sentia seu perfume, sua testa se encaixando perfeitamente embaixo do seu queixo e sua respiração aquecendo seu pescoço. Além de seu coração quase sair pela boca, tudo o que ele sentia era uma vontade quase insuportável de beijá-la.
Mas ela se desvencilhou dele antes que ele pudesse mexer um músculo. Quanto tempo ele havia ficado ali imóvel? Parece ter sido uma infinidade. E nem por isso parece ter sido o suficiente. Ela o pegou pela mão suada e o levou para dentro. Deitaram-se ao lado da lareira sem se desgrudar e ficaram ali abraçados por muito tempo antes que algum deles dissesse qualquer coisa.
Ambos estavam serenos, com olhares distantes. Como ele queria acabar com tudo isso e fugir com ela. Por que não? É claro que ele sabia o porquê. Preocupava-se com sua imagem diante de sua família e de todos do vilarejo. Apenas isso. Mas, ela não era mais importante que todos eles unidos? Será que ela estava pensando nisso também? Será que estava se perguntando também a razão de ele não ter fugido com ela ainda? Será que ela se perguntava se realmente ele a amava?
“Eu a amo”, disse ele falando pela primeira vez, quebrando o silêncio.
Ela olhou nos seus olhos, sorriu e começou a acariciar seus cabelos.
“Também o amo.”
Ele aproximou mais seu rosto do dela, deu um beijo na ponta do seu nariz, subiu um pouco e deu outro na sua testa. Ficaram ali em silêncio mais algum tempo, até ele se levantar.
“Não, fique mais um pouco. Ainda está cedo.”
Ele a princípio nada disse. Ficou de frente para ela, olhando-a deitada no chão.
“Já anoiteceu há muito tempo”, disse ele com toda sua mágoa estampada no rosto.
“Está bem”, respondeu ela, e também se levantou. Foi até a porta e a abriu. Tinha chegado a hora e as lágrimas começaram a cair. Porém, sorria. O sorriso bobo que ele tanto amava. E mais uma vez a impressão foi de que o tempo ali juntos havia sido insuficiente. O tempo passou, voando mais rápido que o vento lá fora. E agora já estava na hora dele partir.
Passou pelo umbral da porta e virou-se para um último beijo. E foi o menos memorável dos beijos. Ele tentava não olhar para seu rosto, porque odiava vê-la chorando, e ela mal conseguia suportar a partida daquele homem que ela conhecera ainda menino e que era, acima de tudo, o maior amigo que ela já havia tido ou que ainda teria nessa vida, independente do que o destino estivesse guardando para os dois.
Acariciou os cabelos dela uma última vez. Última vez em quanto tempo? Ele esperava que em muito pouco tempo.
“Boa noite, durma bem e cuide-se.”
“Você também”, respondeu ela enquanto ele limpava suas lágrimas com o polegar.
Enfim, virou-se e foi caminhando pela estrada, sem olhar sequer uma vez para trás para ver se ela ainda estava na porta. Não queria guardar a imagem dela chorando, e sim a imagem dela sorrindo deitada com ele. De todas as vezes que ele havia ido à sua cabana, essa fora de longe a visita mais silenciosa. E de fato não havia muito que dizer. Ambos já tinham pleno conhecimento de toda a situação e já aguardavam por aquela despedida há semanas. Mas, sempre havia uma esperança de que tudo fosse se resolver e de que ele não fosse convocado a ir para a guerra.
Estava apreensivo enquanto caminhava pelo caminho. A lua já estava alto no céu e nuvens passavam por ela em grande velocidade, tapando sua luz e escurecendo a estrada de vez em quando. O vento ainda estava forte, mas agora batia de frente no seu rosto, jogando os cabelos para trás, como se quisesse dizer para ele não continuar caminhando por aquele caminho, que não seria uma boa idéia, pois uma derrota o aguardaria em alguns meses.
Afastou esse pensamento pessimista e acelerou seus passos.