O conto retrata a vida de um jovem irlandês que perdeu os pais frente a ação do exercito inglês. Apesar de certas semelhanças com "Inimigo intimo" não foi baseado no filme, eu tendo a personagem pronta antes de assistir o mesmo. Porém, devo admitir que alguns eventos teve certa influência do filme.
Espero que gostem da leitura.
Devo postar uma parte diariamente, encurtando assim as mesmas - sendo ele no geral longo.
Abraços!
p.s: O título é o gaelico irlandês de Exercito Irlandês, ou Guerreiros da Irlanda. É o nome pelo qual I.R.A tb responde, tanto no Ulster quanto no Eire (Irlanda do Norte e República da Irlanda, respectivamente)
p.s2: esse conto tem a melhor frase de efeito que eu já fiz na vida! Vale a pena só por causa diso..haha
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Óglaigh na hÉireann
Are the men that God made mad
For all their wars are merry
And all their songs are sad.”
(Eles são os homens que Deus enlouqueceu/ Alegres estão para as guerras/ E todas as suas canções são tristes) - G.K.Chesterton - “For the Gaels of Ireland”
For all their wars are merry
And all their songs are sad.”
(Eles são os homens que Deus enlouqueceu/ Alegres estão para as guerras/ E todas as suas canções são tristes) - G.K.Chesterton - “For the Gaels of Ireland”
30/01/1972, Derry - Irlanda do Norte (Ulster) – Bloody Sunday
Uma passeata de católicos avançava pelas ruas do bairro nacionalista de Bogside, clamando - pacificamente - pelos direitos e pelo fim da opressão inglesa, que durava mais de oito séculos.
Protestantes, unionistas, reagiam violentamente à passagem das pessoas em marcha, alguns não se continham em apenas agredir verbalmente, atirando pedras e paus contra eles. Apesar desse risco, muitos católicos levavam seus filhos com eles, alguns garotos agiam como se estivessem em uma grande parada, com bandeirolas, gritando palavras de liberdade e incentivo.
Entre os homens que caminhava com seu filho nos ombros, estava Gerald O’Falloein, um dos políticos do retomado Sinn Féin, que começava a subir no conceito das pessoas. Era radical, porém, humanitário e justo. Tinha carisma, e até mesmo alguns unionistas já pensavam em lhe dar os votos, apesar dele ser fervorosamente a favor da separação da Irlanda do domínio inglês. Alguns rivais dele começavam a ligá-lo aos grupos armados que ganhavam o poder mais uma vez, como o I.R.A.
Apesar dessa informação não ser de toda infundada, não conseguia arrancar os seguidores que aquele sorriso sincero e palavras fortes conseguiam trazer.
Ao lado dele caminhava sorridente sua esposa, Hanya, que apesar de não ser natural da Irlanda, e sim da Escócia, tomava para si às verdades do marido.
Eles caminhavam despreocupados em meio à multidão, esperavam que aqueles movimentos ganhassem força entre as pessoas, sem ter que apelar para a violência, pela parte de nenhum dos grupos, seja unionistas ou republicanos.
Num movimento rápido o jovem que estava sobre os ombros do pai saltou sobre a mãe, que pendeu um pouco para o lado, sorrindo. O jovenzinho de oito anos, longos cabelos ruivos e belos olhos azuis, como os da mãe, estava bastante animado, apesar de não entender direito todos os motivos da marcha, gostava da idéia de estar ajudando seu pai a libertar sua nação.
Gerald ia dizer algo para seu filho, quando foi interrompido por gritos de pessoas na passeata. Eles diziam que jovens tinham atacado a barricada do exercito, e este por sua vez tinha reagido violentamente. Aos poucos as pessoas começavam a agir mais temerosas, as lembranças da resolução da passeata de 69 ainda ardia em suas mentes.
Gerald afastou-se de sua família, tentava acalmar e reaver a uniformidade da marcha, quando um tiro foi ouvido. O desespero aumentou, as pessoas corriam tentando se proteger de outros possíveis tiros.
Tropas do exercito britânico começavam a surgir, até mesmo pára-quedista caiam no solo, armados, prontos para a ação. A multidão por um breve momento relaxou, acreditou que eles estariam ali para protegê-los.
A tranqüilidade durou pouco, eles começaram a atirar contra a multidão desarmada.
Gerald ficou atônito frente aquele abuso. Seus olhos não acreditavam no que viam, e suas pernas não respondiam direito aos seus comandos. Por instinto ele correu até uma das vitimas que caia próximo a um soldado.
Ele nunca chegou até ela.
Recebeu um tiro que atravessou seu peito, estava morto antes de bater contra o chão frio.
Hanya tentava se proteger com o filho, que chorava até ver o pai cair. Ele gritou, fazendo a mãe se voltar. A mulher parou por uns instantes, colocando o filho fortemente contra o peito, tentando impedir que ele visse mais da chacina que estava acontecendo.
O jovem Sean pode sentir a mãe correr, podia ouvir seu coração bater como se fosse explodir, ouvia o grito da multidão emudecido pelas explosões das armas, sua cabeça girava por causa do cheiro de sangue, pólvora e lágrimas.
Ele sentiu o chão repentinamente, rolou com o impacto. Com esforço ergueu a cabeça, vendo a mãe caída em frente a ele. Engatilhou até ela, parando ao seu lado, segurando sua mão. Via sua vida escorrer por um buraco em meio a suas costas e não podia fazer nada. Olhou para os lados, queria ajuda, queria que um dos adultos ali o protegesse e levantasse sua mãe, porém, apenas via homens e mulheres correndo, e muitos outros caindo frente aos tiros dos soldados.
Não entendia por que soldados atiravam contra eles, já que sua função era protegê-los, não entendia por que eles lhe tiraram seu pai, muito menos sua mãe, e muito menos entendia aquilo que crescia dentro dele, se mesclando ao medo, que mais a frente alguns chamariam de ódio.
Depois eles pararam de atirar, homens choravam como crianças, enquanto Sean não tinha mais lágrimas, apenas estava sentado ao lado da mãe, segurando fortemente sua mão.
Demorou alguns minutos até alguém com intuito de socorro chegasse, e mais alguns para irem até o jovenzinho. Com esforço um pára-médico conseguiu separá-lo do corpo da mãe.
Fraternalmente ele tentava acalmar o garoto, que se mantinha atônito a todos aqueles acontecimentos. Agia como um boneco, sendo manuseado pelo pára-médico, que o examinava habilmente.
- Malditos ingleses, como podem acabar com a vida de pessoas assim, como podem fazer isso com uma criança?! - perguntou choroso o médico, enquanto olhava a cena sinistra.
Aquelas palavras repetiram-se milhares de vezes na cabeça do jovem, até os dias de sua morte, como uma oração interminável.
Estenderam-se alguns dias até o jovem Sean ser descoberto por parentes, e durante esses dias ele não falava muito, e o que falava geralmente não tinha muito nexo, dormia apenas sobre efeito de medicamento, seus olhos se tornaram acinzentados e ele definhava aos poucos.
Seu avô paterno decidiu seguir o que dizia o testamento do filho, levando o neto com ele para o Eire, onde se tornaria responsável pela sua educação.
Porém, o mais importante que o garoto poderia aprender, a única lição que ele usaria para guiar toda sua vida, tinha sido aprendido no fatídico dia que recebera o nome de Domingo Sangrento.