A Primeira Canção: O Bardo Branco
A Estalagem do Bardo estava cheia naquela noite fresca. Homens comemoravam a boa e farta colheita, bebendo em grupos barulhentos. Jovens inexperientes perdiam seu dinheiro em jogatinas e quedas-de-braço. As atendentes desfilavam entre as mesas, servindo aos clientes com seus pedidos e oferecendo-lhes outros serviços.
Não havia aventureiros naquele momento, o que fez Mahatma suspirar entediado atrás do balcão. Naquela noite, ele gostaria de ouvir uma nova história ao invés de contar uma das que conhecia. Queria aumentar seu repertório.
Apesar de sua aparência jovial, era do conhecimento de muitos que o estalajadeiro possuía uma boa dose de anos a mais que as linhas de seu rosto permitiam mostrar. Sabiam também que ele já havia viajado por muitos lugares e que não pertencia ao reino de Tennaris. Por seu nome e fisionomia, arriscavam origens no reino de Pandora, onde, diziam, as pessoas tendiam a nomes diferenciados.
A noite já ia alta quando as vozes começaram a clamar por suas lendas e canções. Mahatma terminava de servir a última jarra de vinho, pedida por um sonolento rapaz que passara da conta, e se preparava para ir até o pequeno palco próximo dali. Foi quando percebeu a entrada de uma peculiar figura em seu estabelecimento.
Era um elfo muito alto, de longos cabelos prateados, trançados até a metade de seu comprimento e presos por uma sedosa corda azul. Tinha a pele alva, levemente corada nas bochechas, e finos lábios avermelhados. Olhos azuis de uma beleza indescritível e ar enigmático, como há muito não se via entre os imortais. Vestia uma túnica azul-clara, quase branca, sobre a leve armadura de mesmo tom. Nenhuma arma em sua cintura, apenas um caro bandolim feito em carvalho e de cordas prateadas a ser carregado em suas costas.
O estalajadeiro não escondeu a estranheza em seu olhar ao deparar-se com um bardo tão peculiar e, ao mesmo tempo, vestido tão discretamente. Passaria facilmente como um sacerdote do deus da justiça ou mesmo por um mago. Mas aquela fisionomia o desagradava por alguma razão a qual não conseguia se lembrar.
Sem dizer uma palavra, o belo elfo se dirigiu ao palco, tomando em mãos o seu instrumento musical e tocando uma delicada melodia. As primeiras notas soaram estranhas, aos ouvidos de Mahatma, e divinas, aos ouvidos dos demais.
- Na extremidade do destino, o que nós podemos ver? A glória crescente dos justos? Ou a decadência dos seduzidos? – Anunciou o bardo élfico com uma voz sedosa, sem ao menos dizer seu nome e sua origem.
O silêncio se formou, arrancando um sorriso satisfeito do menestrel branco, que prosseguiu após uma ligeira pausa dramática.
O estalajadeiro parou seu serviço e, pela primeira vez em anos, apoiou a cabeça sobre a mão, como uma criança atenta à história contada pelo avô. O que o elfo queria dizer?
- Dikaios, A Virtuosa, também se deparou com esse dilema cruel...