Mundo da Razão

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Mensagempor Magyar em 31 Ago 2011, 00:35

Jéssica é professora da primeira série. Com o seu tamanho que impõe respeito em qualquer criatura com menos de um metro de altura, ela explica para as crianças como o mundo está ligado à matemática.

- Então, se você tem um ratinho e ganha outro ratinho, você terá DOIS ratinhos! Um mais um é igual a dois! Entenderam?

É então que Ana levanta a mão, como bem aprendeu nos primeiros dias de aula com Jéssica.

- Pôfessôôôaa! Meu imão dinha um radinho e ganhou oudo radinho, mas agoa ele dem um mundão assim de radinhos! - falou mexendo todos os dedos da mão.

Jéssica tentou acalmar a sala, que agora comentava de cachorrinhos, gatinhos e peixinhos. Enquanto isso ela pensava na resposta que poderia moldar melhor a lógica do pensamento.

- Silêncio... silêncio...! Então, Ana, mas o que aconteceu foi que eram ratinhos de diferentes sexos, e eles provavelmente se acasalaram e tiveram filhotinhos... se multiplicaram! Mas fiquem tranquilos, a multiplicação e a tabuada vocês só aprendem no ano que vem. Um outro exemplo de soma que vocês podem usar: você tem uma bala. Alguém te dá outra bala, quantas balas você tem agora? - fala ela olhando para a sala com olhos bem abertos e um sorriso que apontava para a mão fazendo o número dois.

- UMA! - Grita Guilherme. Todos olham para ele enquanto a professora o questiona.
- Uai fessora.. Não dá pra dar uma bala pra quem já tem bala! Se eu ti dou uma bala, é purque você já comeu a sua!
- Boa observação, Guilherme. Porém, você fez uma subtração, e só a veremos na próxima aula.

Assim, lá se vai mais uma geração em que 60% dos alunos não SUPORTAM matemática. Basicamente porque não faz lógica em seu mundo. Ana e Guilherme se deram bem com matemática, pois correram atrás de suas dúvidas. Outros oito não tiveram problemas. Mas o que fazer com os outros quinze que morriam de medo do que surgiria na próxima aula?

E isso cresce, te incomoda. Você precisa tirar uma dúvida, mas mal consegue formulá-la e pronunciá-la, pois tem medo que seja boba demais. Levantar a mão então para que todos te olhem? Nem ferrando!

Podem falar que isso é bobeira, só coisa de criança, mas a matemática nos persegue pelo resto da vida. Um trauma tão grande e profundo quanto uma filha que foi abusada pelo pai. Pessoas na faculdade continuam com suas teimosias - afinal de contas, nada como o silêncio para deixar a dúvida menos burra... pena que a variável aprendizado seja inversa à sua pessoa, nesse caso.

Pessoas vivem derivando para integrar-se. Intrigam-se quando a fórmula não funciona. "Quero ser legal que nem fulano... qual será a fórmula certa?". Então lá está você, recriando o seu guarda-roupa e soltando gírias de uma personagem de TV. Algumas pessoas - que normalmente tentam aplicar a mesma fórmula - quando veem, te acham superlegal. Querem descobrir que fórmula você usou para ser assim, e começam a aplicá-la desenfreadamente em busca de resultado. O milagre da sociedade.

Mas, nem sempre, as coisas dão o resultado esperado. Aquele vestido que a Angelina Jolie usou no filme nunca ficará tão sexy em você como ficou nela. Você não será um grande escritor por divulgar textos de Fernando Veríssimo como se fossem seus - ou tentar copiá-los com outras palavras. Fórmulas mais Fórmulas mais Fórmulas. E no final tudo dá errado. Um pesadelo de uma prova de álgebra no colegial.

Você pode ter lido até aqui e continuar pensado: tá bom, realmente, existe muitas pessoas superficiais nesse mundo. Inclusive esse texto. Mas quem disse que a matemática só vai até a integral?

As fórmulas vão muito além. Você às utiliza para determinar o comportamento das pessoas - como se as pessoas não passassem de um gado que precisa de uma chicotada vez ou outra para seguir a direção desejada e permanecer unido.

Você se diz um ser profundo, mas ainda utiliza as fórmulas de amor que encontra em filmes e livros. "Nossa, realmente o amor pode ser profundo... nunca leu Shakespeare?". Porra, os PERSONAGENS se matam! SE MATAM! E pior: por algo que você mal consegue definir! Ah L'amor... Se isso é amor de verdade, prefiro nunca amar.

Você se diz inteligente porque tirou nota alta em um teste de inteligência. Ainda assim, você liga para a sua mãe depois de ser assaltado ou tirar uma nota baixa. Ou quando acontece qualquer outro imprevisto. "Tadinha dela! Sempre tirou nota alta, e agora está sofrendo por causa do péssimo professor que tem... Foi até parar no hospital!". Nessas horas eu penso: ainda bem que sou burro. Ao menos não me martirizo pela minha burrice.

Você se diz superior por "descobrir a fórmula do sucesso", enquanto os demais seres inferiores simplesmente não tem a visão de mundo que você tem. Não copiam a sua fórmula - bando de bastardos ignóbeis sem futuro! Mas você se recusa a admitir que a sua fórmula apenas alimenta ainda mais uma sociedade em decadência. O seu limite tendendo ao infinito, e o da sociedade tendendo a zero. O mundo perfeito.

É fácil se dizer bonzinho e ajudar os outros "em nome do bem maior" - como se você se importasse tanto assim com os outros. Vamos fazer o bolo crescer, e assim dividí-lo igualmente entre todos! Aí está a nossa política, em que metade do bolo sumiu, e a outra metade é distribuída de forma desigual. Alunos que odeiam a matemática, transformando-a em algo surrealista - como uma mágica que ilude as crianças em uma festa. Estar funcionando é o que mais assusta.

Assim seguimos as nossas vidas. Buscando por fórmulas mesmo sem entender a lógica por trás delas. Maldito mundo da razão. Essa reflexão poderia se alongar por muito mais - do mesmo. Porém, prefiro terminá-la com uma questão: como criar uma regressão para ser bem sucedido, com tantas variáveis viesadas? (Em outras palavras: como ser feliz em uma sociedade que define o que deve ser a sua felicidade?)
Quem me leva a sério não deveria ter saído do hospício.
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