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A melhor comida que tem eu acho é o miojo. Imagine ele assim, nem mole nem muito duro, bem quentinho e molhadinho, você chupando uns dois três quatro cinco fios de uma vez pra dentro da boca, umedecendo os lábios, voando gotinhas do caldinho salgadinho que pode ser frango, carne, legumes, ouvi dizer que hoje já tem até outros diversos sabores, feijão, pizza, bacon, quatro queijos, os mais cremosos feitos que o homem já produziu, onde já se viu, pegar picanha e transformar num pozinho de pintar macarrão? As cores dão encanto, são assim o tempero dos olhos, a gente já começa a comer com a visão, pudesse engolia o arco-íris, não podendo, coisa mais perta que eu já vi foram as carpas, com suas escamas pratas, douradas, todas bem brilhosas, refletindo o brilho do sol na superfície d’água e a glória da cidade, ou ao menos disseram foi isso que o prefeito disse, homem bom esse prefeito, acho que não é o de agora, mas podia ser também, não sei, faz muito tempo não acompanho essas coisas, mas homem bom esse prefeito, a prefeitura da cidade já tem tempo tava caidinha, as fontes em volta do prédio tudo parada, ninguém mais não queria andar em volta do paço não, até que o homem bom teve a ideia de revitalizar a área, mandou limpar, pôr água limpa nas fontes, transformar em aquário, botar pra morar umas carpas, diz que peixe assim de tanque não é bom de pescar que são muito bobos, quase não precisa nem de isca, peixe assim de tanque não é bom de comer porque dão muito pão a carne não pega a maciez necessária, bobo é quem diz essas coisas, absurdo é gostar de comida que sabe as artes de fugir, gostar de comida que nem tem carne pra ser comida, ainda bem que as bichinhas eram parrudas, eu peguei foi mesmo com a mão e elas pareciam feitas de liso, inda bem não sabiam fugir mais que essa lisura, fossem menores ia ter que inventar uma isca, quase não vale a pena gastar um prato com outro, depois o tempo de inventar e outro mais rápido já tinha pego na mão mesmo, não tinha só uma carpa e ninguém comeu mais de uma, não fui só eu pescar, ainda fui bobo fiquei com pena dividi a minha, mas nessa vida a gente divide o que der, divide cobertor, divide toldo quando chove, divide até caçamba, ninguém é dono de nenhuma, qualquer um fica com o que achar, sendo colorido como as carpas, sendo amarronzado como é o comum mesmo, na caçamba as coisas se misturam igual quando a gente é criança e ganha guache, mistura e descobre o verde, mistura e descobre o roxo, mistura e descobre o marrom e depois do marrom descobre que quando chega no marrom não tem jeito, daí pra frente só tem marrom, pois é o mesmo com o que tá na caçamba, no saco, não tem jeito, vai o marrom mesmo, se der come perto do restaurante pra comer com a boca uma coisa e com o nariz outra, com nariz cada dia uma coisa diferente, com a boca às vezes sim às vezes não, pena eles do restaurante não podem dar a sobra pra gente, que sobra sim bastante, mas o dono diz que não pode senão acostuma e tem gente pedindo todo dia, mas tudo bem, a gente espera a bondade dalgum funcionário desavisado ou espera às vezes a noite o caminhão esquecer um saco mais preto no escuro e come do preto mesmo, no escuro a cor desfaz, tanto faz se laranja de carpa ou marrom de tudo, fosse miojo não esperava nada, miojo três minutos e tá pronto.