Ritual
Naquela sexta-feira, 13 de agosto, a noite paulistana cheia de névoa parecia encobrir meu ser enquanto em me dirigia à casa de minha amiga. Sorri comigo mesma ao descer do ônibus, ouvindo o vento gelado sacudir meu sobretudo. Os medrosos e preconceituosos estavam trancados em suas casas, com medo, enquanto “gente” como eu saía às ruas. Sem me conter, ri alto e duas garotas à minha frente apertaram o passo.
Cheguei à casa dela e toquei a campainha. Carla apareceu à porta, sorrindo ao ver que eu não viera sozinha: estava acompanhada por uma garrafa de vinho tinto e outra de whisky. Eu a cumprimentei com um beijo no rosto ao entrar.
- O pessoal da mesa já chegou?
- Lógico. Já arrumei quase tudo. Só faltam o “mestre” e a “iniciante”.
Trocamos um olhar cúmplice. Era noite de iniciação, e adorávamos assustar os pobrezinhos...
Levamos as coisas para dentro. Cumprimentei o pessoal com um aceno de cabeça e ajudei Carla a pôr a mesa. Seis lugares de cada lado, uma cadeira negra em uma cabeceira. Os livros já estavam em seu ligar, diante da cadeira do mestre, assim como todo o equipamento.
Beijei meu namorado e ocupei meu assento diante dele. Eu o amo muito, mas nessa noite – como em todas as reuniões – estávamos em lados opostos. As duas faces da maldição...
O mestre chegou, trazendo a novata pela mão: sua namorada. Levou-a até nós e sorriu:
- Gente, essa aqui é a Soraya, que vai omeçar a jogar com a gente. A ficha dela já está pronta, vai ser uma vampira “mekhet”, partidária do “A Lancea Sanctum”. Pode sentar do lado da Kate, Sossô.
Ela obedeceu, retribuindo meu sorriso meio incerta. O mestre distribuiu as fichas para os jogadores (vampiros à esquerda, lobisomens à direita), pegou seus dados de dez faces e começamos nosso jogo de RPG..