Koé!!!
Este é um conto antigo, acho que tem uns dois anos. Tem algumas coisas nele que, hoje, reescreveria, mas decidi postar ele por aqui intacto, tal como foi postado originalmente na velha spell e no meu blog. De qualquer modo, com ou sem alterações, não o considero um conto ruim. Espero que apreciem ;-)
Falow e té +!!!
Ass.: JOE K.R [se preparem para um conto depressivo!!!]
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RELATO DE UM SUICIDA
Apesar do sol estar castigando lá fora, elevando a temperatura a níveis insuportáveis, a casa se encontrava com as janelas trancadas e as cortinas fechadas. Os raios solares transpunham as cortinas, pois estas não eram tão grossas, e davam uma iluminação parcial.
A porta do meu quarto estava encostada, deixando o local ainda mais abafado, tendo somente como alívio para o calor tortuoso um ventilador ligado à baixa velocidade. A cama estava desfeita –não a arrumava havia dias, pois lá passei deitado na maior parte do tempo neste período de não arrumação. O cheiro fétido de suor acumulado que impregnava o ambiente não me incomodava; eu estava mais preocupado com outras coisas no momento...
Olhava a minha imagem no espelho. Os cabelos estavam totalmente amassados, despenteados e os meus olhos, vermelhos de tanto chorar e com olheiras logo abaixo, devido às noites mal-dormidas. A minha pele estava pálida, o meu corpo estava fraco, e os ossos levemente acentuados em cima da pele; a depressão, que me impedia de comer, já devia ter me roubado uns cinco ou seis quilos.
No momento, as lágrimas já haviam cessado; eu apenas encarava o meu reflexo, tentando tomar coragem para aceitar a escolha que fiz. Apesar da minha vida ter sido um acúmulo ininterrupto de problemas progressivamente piores e a morte me parecer o único alívio possível para o suplício da minha existência, ainda havia dentro de mim aquela insegurança quanto à decisão, o medo de estar cometendo o maior –e o último –erro da minha vida. Afinal, o suicídio é algo que, depois de feito, não há como ser desfeito.
Sentia-me um covarde, não somente por escolher a mais aliviante e simples das opções, porém a mais drástica e desesperada, mas sim também por não ter nem coragem suficiente para realizar aquele ato de covardia. A minha auto-estima se rebaixava a níveis cada vez mais baixos, quase chegando a perfurar o chão sob os meus pés.
“Não tenho outra escolha. Esta vida é uma merda. Tenho que por o fim nisso!”, disse a mim mesmo numa voz rouca e fraca, mas com certa firmeza.
Fui andando lentamente até o banheiro. Ao chegar, abri a porta do armarinho e de lá retirei a caixa de remédios. Coloquei-a em cima da pia e comecei a separar todas os pacotes de pílulas que encontrava em seu interior.
Novalgina, Bactrim, remédios para insônia, antidepressivos... Ia separando tudo o que eu encontrava.
Sai do banheiro e fui à cozinha, levando comigo todos aqueles pacotes de pílulas que separei. Lá, enchi cinco copos com água.
“Agora é a hora!”, pensei. Então, abri o primeiro pacote, peguei a primeira pílula. Meio receoso, a coloquei na boca e a engoli com a ajuda de um gole d’água.
O primeiro passo é sempre o mais difícil; depois, tudo fica mais fácil. Tomei a segunda, a terceira, a quarta e as demais pílulas sem dificuldades. Era quase automático. Às vezes, eu parava e as encarava por algum tempo; então, a reprise de algum trauma passava diante dos meus olhos, como se eu estivesse revivendo aquela lembrança recente ou distante. E isto me encorajava a continuar.
Não sei ao certo quantas pílulas tomei, só sei que foram muitas. E que, a medida em que eu ia tomando-as, meu corpo ia ficando mais fraco, minhas pálpebras mais pesadas e meu raciocínio mais lerdo.
Só parei de colocá-las para dentro quando já não havia mais nenhuma a minha vista.
Retornei ao meu quarto, e me sentei no chão –estava difícil me manter de pé -, na frente do espelho, para mais uma vez ficar me encarando. Senti um enjôo muito forte, uma ânsia de vômito terrível, daquelas em que você não consegue vomitar de jeito algum, apesar do imenso mal-estar e da vontade.
A minha cabeça estava abaixada. Resolvi, então, erguê-la, para que eu encarasse a minha própria face no espelho. Olhei profundamente dentro dos meus próprios olhos refletidos. E, subitamente, uma voz gritou dentro de mim: “mas que merda você está fazendo contigo?”
Paralisei. Fiquei sem reação. E eu perguntei para mim mesmo, tomando consciência do rumo a que as coisas tinham tomado: “mas que merda estou fazendo comigo?”.
Sim, eu tinha muitos momentos de tristezas e era muito depressivo. Mas havia ainda, dentro de mim, aquela vontade de viver ainda. Vontade esta que não compreendia, apenas sentia. E isto que me enchia de arrependimento –aquele sentimento que nos leva a condenar a nós mesmos pelo que fizemos ou deixamos de fazer.
Levantei-me com dificuldade, abaixei a cabeça e tentei vomitar todas aquelas pílulas. Mas, não saía nada. Tentei pular e socar o peito, mas nada me fazia conseguir pôr para fora aquilo tudo.
Sentei-me novamente e encostei as minhas costas na parede. Entreguei-me ao mais profundo choro. Juntei as duas mãos diante de mim e, soluçando, comecei a rezar. “Deus, me salve!” E “Jesus, não quero morrer” eram as frases que falava. Pedia salvação com clamor.
O quarto a minha volta foi escurecendo e se tornando cada vez mais frio. Uma calmaria se instaurou dentro do meu ser, interrompendo o pranto. O choro cessou.
“Está na hora!”, disse para mim mesmo. Uma última e fria gota de lágrima escorreu lentamente pelo meu rosto. Dei um suspiro fundo e fechei os olhos.
Fechei os olhos para nunca mais abri-los...