Spell RPG

Lucas C. Lisboa

Chegou à sua casa muito abalada. Passou pela sala sem nem se dar conta se lá havia ou não alguém presente - pouco lhe importaria tal naquele momento. Passou pelo corredor até chegar à porta de seu quarto e, achando que tudo estava perdido, trancou-se. Aos prantos, na sua cama deitou-se e soluçou e chorou até adormecer pesadamente.

Despertou com todo seu corpo alquebrado; um mal estar terrível lhe subia pelo amargor salgado que habitava sua boca. Não tivera sonhos, mas ainda remoia seu triste destino. Tudo que queria era desaparecer, mas abriu o chuveiro e, ao cair das águas mais cálidas, aconchegou-se novamente. Reconfortada, misturou nas águas suas próprias mágoas.

Terminado o pranto e o banho, sentou-se à penteadeira para seus cabelos escovar e, sob o seu reflexo, pôs-se a refletir sobre si mesma, refletir sobre ele, refletir sobre o que acontecera, refletir sobre o que os outros achariam, refletir sobre o futuro, refletir sobre sua vida, refletir sobre tudo que pudesse ser refletido. Refletir. E, em meio a suas reflexões, não teve dúvidas e refletidamente tornou-se espelho.

Uma fuga de alguém que não consegue encarar os fatos. É interessante que é uma escolha consciente.

Assumar escreveu:Uma fuga de alguém que não consegue encarar os fatos. É interessante que é uma escolha consciente.

O que mais gosto nos contos é da multiplicidade de significados, sentidos e interpretações.

Naquele momento, na frente do espelho, pensando nas muitas formas em que deveria corrigir sua propria imagem, talvez ela tenha deixado para trás a dor que a fizera cair em prantos na noite anterior... Tornar-se alguém que pudesse encaixar em todos os conceitos que ela tanto pensava, e acabou deixando de ser ela mesma.
Na verdade, li várias vezes e em cada leitura, mudei a opinião sobre a mocinha no espelho... Por fim, acho que a fuga existe mesmo... O seu mundo se reduziu primeiramente ao quarto em que se trancou e por fim fechou-se na penteadeira onde se observava e tentava dramaticamente alterar o rumo de sua vida, na frente do espelho, sem precisar vencer necessariamente nada exterior a não ser seu próprio reflexo..
Affe
Mto bom bom o conto por fim! (acho que viajei demais)

Sr.Personna escreveu:O que mais gosto nos contos é da multiplicidade de significados, sentidos e interpretações.

Sem dúvida. Na verdade, essa multiplicidade está presente em quase tudo que se escreve, mas nos contos fica mais evidente.
Seria bom que mais pessoas comentassem suas impressões e comungássemos das riquezas que um mesmo texto pode possuir.

Aenis,

Muito boa a interpretação, uma leitura, uma releitura... Envaideço-me quando meus textos são lidos e despertam tanta atenção.